O grasnar das araras-canindé é o primeiro som que escutamos ao chegar ao Instituto Libio, em Porto Feliz, a 120 km da capital paulista. Vítimas do tráfico de animais silvestres – a terceira maior atividade ilícita do mundo –, as aves foram retiradas de forma traumática da natureza e encontram nesse projeto de conservação um ambiente de bem-estar, ainda que não possam viver livremente.
Quem preside o instituto é a dermatologista mineira Raquel Machado. Em busca de um refúgio na natureza próximo à capital paulista, a médica adquiriu em 2006 um sítio em Porto Feliz. Seu plano inicial era trabalhar pela proteção da área, mas tudo mudou quando encontrou um papagaio engaiolado, deixado pelo antigo proprietário.
Indignada com a situação, Raquel buscou informações junto ao Ibama para ter um mantenedor em sua propriedade. Após criar o primeiro recinto para acolher animais, conseguiu a licença no Ibama e, no dia seguinte, recebeu outros 18 papagaios em situação de abandono.
Criação do instituto
A construção de recintos para receber outras espécies levou a médica a criar, em 2010, o Mantenedor Raquel Machado. Hoje, o lugar abriga mensalmente 130 animais em 15 recintos espaçosos. São mais de dez espécies protegidas, entre araras, papagaios, periquitos, antas, cachorros-do-mato e macacos, além de espécies ameaçadas de extinção. Exceto filhotes de macacos-bugios, órfãos devido à febre amarela, os outros bichos são advindos do tráfico.
Com uma equipe composta de veterinários e biólogos, o mantenedor trabalha com três pilares: acolhimento dos animais resgatados, reabilitação e soltura das espécies aptas a voltar para a natureza. Exemplo do último caso é o lobo-guará Canelinha, que tem o mínimo contato com humanos, para em breve ser reintroduzido no seu habitat natural.
Todo o trabalho de Raquel foi feito com recursos próprios. Visando ampliar sua atuação, ela criou em 2020 o Instituto Raquel Machado. “Após dez anos acolhendo animais, decidi criar o instituto para causar um impacto maior tanto no meio ambiente como para conscientizar sobre esse problema enorme que acontece no nosso país”, conta. Em 2023 o projeto passou a se chamar Instituto Libio, em homenagem a seu avô, sua grande inspiração no trabalho de preservação.
Conservação de biomas
Com o intuito de reabilitar e devolver algumas espécies aos seus habitats naturais, Raquel visitou diferentes biomas brasileiros. Ao testemunhar áreas devastadas, decidiu criar as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) para conservar a biodiversidade de algumas regiões. São elas as Reservas Saci e Santuário, em Bonito (MS), a Reserva Santa Sofia, no Pantanal (MS), e a Reserva São Benedito e Rio Azul, na Amazônia paraense, onde também é desenvolvido um projeto de ecoturismo. Hoje, a atuação do Instituto Libio se estende por quatro biomas – Mata Atlântica, Cerrado, Pantanal e Floresta Amazônica –, com sete refúgios de vida silvestre.
Além de presidir o instituto, Raquel é também Conselheira da Fundação Neotrópica do Brasil e do Onçafari e vice-presidente da SOS Pantanal.
O Instituto Libio não é aberto à visitação do público em geral, pois é necessário preservar a integridade dos animais. A exceção são as visitas de pequenos grupos de alunos das escolas municipais da região para um trabalho de educação ambiental. Para apoiar o projeto, visite institutolibio.org.br