Roma em fatias

A arte de explorar a Cidade Eterna por meio de suas pizzas

Você ama pizza, eu também. Por isso, vamos combinar uma coisa: estando em Roma, você não fará à cidade e a seus habitantes a desfeita de tratar uma pizza autêntica como enfeite para ketchup, nem como palco para dez sabores ao mesmo tempo.

Na capital da Itália, há regras para apreciar essa especialidade (algumas escritas, outras de bolso) e uma beleza que desabrocha quando a gente as respeita.

Não se trata de etiqueta. É uma linguagem. Você vai morder histórias. Vai ouvir a massa estalar. Vai aprender a dizer “così” (“assim está bom”) com os dedos, indicando o tamanho do seu pedaço. E, se vier com cabeça e coração abertos, vai voltar para casa diferente.

Fechado?

A língua da pizza

Fenômeno global, a pizza é um dos pratos mais amados do mundo e, naturalmente, ganhou diferentes sotaques. Por isso mesmo, sua verdadeira essência, enraizada na cultura e na tradição italianas, é muitas vezes mal compreendida por quem chega de fora. Longe das versões de uma massa sobrecarregada de ingredientes (alô, Catupiry!), a pizza autêntica é uma celebração da simplicidade, do preparo artesanal e da qualidade de seus componentes.

Respaldo não falta. Na Itália, são consumidos nada menos do que 2,7 bilhões de pizzas por ano (7,4 milhões por dia), de acordo com a Coldiretti, a maior confederação de produtores agrícolas do país. E o resultado é um mosaico de tradições para degustá-las, especialmente em sua capital.

Mais do que apenas fazer uma refeição, apreciar uma boa pizza em Roma é a oportunidade de mergulhar na história, na arte e na vida cotidiana da Cidade Eterna.

Guia da pizza romana
Um gole de birra (cerveja), uma mordida na massa crocante e Roma segue acontecendo à mesa | iStock

Os três estilos de pizza romana

A pizza romana se revela em diferentes estilos, cada um com horário, humor e jeito de conquistar próprios. Pense na cidade como um tabuleiro. Há a redonda de mesa para o jantar, a de balcão para a caminhada sem pressa e a “prima” oval que virou queridinha dos tempos leves. Vamos conhecê-las.

Tonda (a crocância que fala “scroc”)

É a protagonista da cena romana, conhecida pela massa fina e crocante (“scrocchiarella”) do centro às extremidades. A borda, aliás, não se assemelha à da napolitana (o chamado corniccione, alto, macio e aerado). A graça da tonda romana está na leveza. A massa é aberta em espessura bem fina (vários lugares fazem isso com rolo) e assada para ficar dourada e estaladiça, entregando um “scroc” limpo a cada mordida. Menos ‘carvão’ na borda, mais estalo constante. É uma pizza que some do prato sem pesar no estômago, perfeita para acompanhar uma birra (cerveja) e seguir a noite.

+ Leia outros roteiros gastronômicos publicados na UNQUIET

Tonda em grande estilo: a Marinara servida na Emma Pizzeria | Instagram @emma_pizzeria_restaurant
Guia da pizza romana
Arcos sobre o Tibre, reflexos dourados na água e, no alto, a cúpula de São Pedro: Roma em estado de rito | iStock

Al Taglio (literalmente, “pizza cortada”)

É a face mais street food da pizza romana, assada em grandes assadeiras retangulares (as teglie, daí o nome pizza in teglia). É cortada na hora, em boa parte das vezes com tesoura, e vendida por peso. Você aponta o tamanho, eles pesam e servem. A leveza vem de fermentações longas e de massas muito hidratadas, que ficam alveoladas por dentro e crocantes por baixo. O formato se consolidou em Roma entre o fim dos anos 1950 e os 1970, e ganhou uma virada de qualidade nos anos 2000, com maturações mais extensas e melhor seleção de farinhas e ingredientes. Peça ao jeito romano: aponte três ou quatro sabores em pedaços pequenos e coma em pé no balcão ou na praça. É assim que o romano faz seu lanche entre um compromisso e outro.

Pinsa (oval na tábua, leve por natureza)

O nome vem do latim pinsere (“achatar/estender”). A inspiração remete às focaccias planas do Lácio e às massas assadas em teglia da Roma antiga, mas a pinsa que comemos hoje é contemporânea, criada no início dos anos 2000, com massa de alta hidratação e uma combinação de farinhas (trigo, arroz e soja) concebida para ser mais digerível graças às fermentações longas. De formato oval e, muitas vezes, servida em tábuas de madeira, a pinsa traduz bem o espírito romano atual, inspirada na história sem replicá-la literalmente. Tanto que, em 11 de março de 2025, a pinsa romana ganhou status oficial, reconhecida como Produto Agroalimentar Tradicional (PAT) do Lácio, o que estabelece a ligação entre o produto e o território romano.

O balcão da pizzaria Pizzarium, em Roma, com pizza al taglio
O balcão da Pizzarium, com várias opções da pizza al taglio | Instagram @bonci_gabriele
Pinsa à mesa com birra na Il Ponticello
Pinsa à mesa, com uma boa birra na Il Ponticello | Instagram @ilponticelloroma
Pizzas individuais na Ai Marmi
Pizzas individuais na Ai Marmi | Instagram @pizzeriaaimarmi

Em Roma, (coma) como os romanos

Agora que você sabe como identificar os estilos de pizza tipicamente romanos, vamos falar de como realmente apreciá-los in loco. Esta parte é sobre as regras não escritas, que vão ajudar você a evitar os erros clássicos que só os viajantes desavisados cometem.

  1. Uma pizza por pessoa. Em pizzeria, cada um pede a sua. É a norma cultural, não um desafio gastronômico. Não se assuste, elas são mais leves do que parecem. Você dá conta, prometo. 
  2. Nada de ketchup. Entre os italianos, colocar ketchup na pizza é visto como “sacrilégio”. Se quiser apimentar, peça óleo picante (olio al peperoncino).
  3. Mãos à obra (sobretudo na tonda romana). A scrocchiarella é finíssima e crocante, e comê-la com as mãos é até recomendável.  
  4. Confie no pizzaiolo. Em Roma, muitas casas trabalham receitas pensadas para equilibrar massa, molho e cobertura. Em vez de “customizar”, escolha um sabor do cardápio e deixe o autor brilhar.
  5. Para acompanhar, peça uma birra. A dupla pizza-cerveja continua sendo o casamento mais comum. A cena atual também abraça vinhos e coquetéis, e as bolle (espumantes) entram em cena sem formalidade. Ainda assim, a cerveja segue como referência popular. Se quiser pedir como um local, diga “una media alla spina” (um chope médio). 

Sabores do cotidiano

No balcão, Roma fala primeiro com a pizza bianca (al taglio, branca, sem molho, só azeite e sal). Aberta como um sanduíche e recheada com mortadela recém-fatiada (pizza e mortazza) é um clássico absoluto na cidade. A mesma bianca ganha status de lanche cult no fim do verão, com prosciutto e fichi (presunto cru e figos). A irmã vermelhinha, a pizza rossa (massa fina pintada de tomate, azeite e sal), é outra instituição de vitrine. E quando você vê bandejas com Fiori di Zucca e Alici (flor de abobrinha com anchovas) ou Patate e Rosmarino (batatas com alecrim), saiba que está diante da gramática básica da pizza al taglio. 

Entre as casas históricas, há até a pizza de patate + porchetta. A do Antico Forno Roscioli é emblemática.

Agora, se for à mesa, quando a protagonista é a tonda scrocchiarella (a redonda fininha, crocante do centro à borda), o padrão-ouro continua sendo a Margherita. E esse apego à tradição não é impressão. Um levantamento feito pela plataforma de reservas on-line TheFork (2025) mostrou que 65% dos italianos preferem sabores tradicionais, com Margherita e Capricciosa (mozzarella, presunto cozido, champignon, corações de alcachofra) à frente. No dia a dia romano, também aparecem muito Diavola (mozzarella e salame picante), Prosciutto e Funghi (mozzarella, presunto cozido, champignon), e Quattro Formaggi (mozzarella, gorgonzola, fontina e Parmigiano Reggiano). São clássicos de confiança que mantêm a conversa no que interessa: ponto de forno, leveza da massa, qualidade do tomate e do queijo. 

E, porque Roma gosta de brincar com a própria tradição, a onda contemporânea levou para a pizza suas massas mais queridas. A Amatriciana virou sabor fixo em casas cult, com cobertura de tomate San Marzano, guanciale (bochecha suína curada), pecorino e pimenta sobre uma base levíssima. Na Seu Pizza Illuminati, por exemplo, está no cardápio.

Esses sabores de balcão são o manual de bolso da pizza romana. Mas teoria sem prática não enche barriga, certo? Vamos às casas que mantêm essa tradição viva.

Pizza Bianca na Antico Forno Roscioli em Roma
Pizza Bianca na Antico Forno Roscioli / Instagram @anticofornoroscioli
O ambiente contemporâneo da Emma Pizzeria, em Roma
Salão clean, serviço preciso na Emma Pizzeria: aqui o protagonismo é da tonda | Divulgação

Onde comer pizza tonda romana
(fininha, crocante)

Pizzeria da Remo (Testaccio)
Logo na entrada, um forno a lenha crepitante abre caminho para o local mais movimentado de Testaccio, onde os sabores clássicos brilham. A Capricciosa (mozzarella, presunto cozido, champignon, corações de alcachofra) é uma das mais pedidas. Para os romanos, ir à Remo, na Piazza Santa Maria Liberatrice, é quase um rito de passagem. Sem frescura, com o barulho da casa, garçons apressados e filas que fazem parte do tempero. Os viajantes chegam mais cedo; os locais, só depois das 21h. O segredo? Aqui se come rápido, sem encenação, e a scrocchiarella chega sempre fininha e no ponto.

Ai Marmi (Trastevere)
O nome oficial é Panattoni, mas ninguém em Roma chama assim. É “Ai Marmi” e pronto, uma referência às antigas placas de mármore de seu interior. Aberta até tarde, é o endereço de pós-cinema, pós-show, ou simplesmente da fome da madrugada. O salão barulhento, os garçons que parecem correr contra o tempo e as mesas compartilhadas são parte do charme. Romanos costumam pedir Margherita, Napoletana e Marinara, e ninguém resiste aos fritti, como são chamadas as entradinhas fritas, como as crocchette di patate (croquetes de batata cremosos por dentro, dourados por fora).

Emma Pizzeria (Centro Histórico)
Localizada entre Campo de’ Fiori e Piazza Navona, a Emma não é uma pizzaria de bairro, mas o destino certo de quem busca qualidade impecável. O romano escolhe a Emma quando quer uma tonda de ingredientes escolhidos cuidadosamente (farinha Roscioli, presunto de Parma, cogumelos da estação). A Napoli&Cantabrico, por exemplo, ganha molho de tomates orgânicos “Piennolo” do Vesúvio, tomates Corbara, anchovas do Cantábrico Ramón Peña e azeite de oliva orgânico Castello di Monsanto (da Toscana). O ambiente contemporâneo e o serviço preciso dão a sensação de estar em um “restaurante de pizza”, mais do que numa pizzeria típica, mas sem perder a alma romana.

Alle Carrette (Monti)
Para quem vive em Roma, a Alle Carrette é sinônimo de pizza rápida e honesta depois de um giro pelas ruas de Monti. As mesas na rua, o serviço ligeiro e os preços camaradas explicam por que sempre há fila no verão. É onde o romano encontra os amigos quase no improviso. Basta chegar, pedir uma Margherita, Napoletana ou Marinara para sentir a massa fininha e a borda tostada. Se quiser algo mais salino, vá de Prosciutto e Funghi ou Diavola. É tonda romana sem firula, uma por pessoa, assada em forno a lenha.

Gabriele Bonci, o "Michelangelo da Pizza", à frente da Pizzarium, em Roma
Gabriele Bonci, o “Michelangelo da Pizza”, apresenta a mortazza da Pizzarium | Instagram @bonci_gabriele

A pizzaria CasaManco, no coração do Mercato di Testaccio
CasaManco, no coração do Mercato di Testaccio | Instagram @dacasamanco

Onde comer pizza al taglio
(por peso, na bandeja) 

CasaManco (Mercato di Testaccio)
No box 22 do Mercato di Testaccio, o casal Paola Manco e Andrea Salabè fazem pizza al taglio com massa de farinhas orgânicas e semi-integrais maturada por até 100 horas, com coberturas sazonais criativas. É balcão puro-sangue de mercado. Você aponta, eles cortam e pesam, e a fatia é apreciada ali mesmo. As combinações são deliciosas, muitas delas em contraste com queijos como pecorino romano gratinado, ou especialidades sazonais do mercado. Aqui também são preparadas ótimas pizzas vegetarianas e veganas.

Pizzarium – Gabriele Bonci (Trionfale/Vaticano)
Para o mundo, Bonci é “o Michelangelo da Pizza”. O chef elevou a pizza al taglio ao nível de arte, e há até um episódio dedicado a ele na série Chef’s Table: Pizza, na Netflix. Para os romanos, é também uma experiência que virou quase turística, mas ainda vale cada pedaço. A casa prioriza produtos DOP/IGP e sazonais, que elevam o patamar de sugestões como a Scarola e Alici (escarola salteada com azeitonas Taggiasca e anchovas) e a sazonal de inverno Cavolo e Cinta (couve toscana, pecorino stravecchio de Pienza e pancetta di Cinta Senese). Os moradores da região param para uma fatia rápida, os visitantes fazem fila para provar coberturas sazonais e criativas. O balcão é pequeno, e comer em pé faz parte.

A fachada da padaria romana Forno Campo de’ Fiori e o ritual da manhã na praça
A fachada da Forno Campo de’ Fiori e o ritual da manhã na praça: a vida passa devagar enquanto a massa ainda guarda o calor da pedra | Instagram @fornocampodefiori

Antico Forno Roscioli (Campo de’ Fiori)
Clássico romano de vitrine onde o simples é levado a sério. Em atividade pela família Roscioli desde 1972, está instalado num forno da Via dei Chiavari que remonta a 1824, daí o “antico”. É o lugar onde os romanos passam só para uma mordida e saem carregando bandejas de pizza bianca recém-saída do forno e de rossa de tomate vivo. A Patate e Rosmarino é a leitura mais “direta” da pizza de batata (sem o recheio de porchetta), crocante por baixo e aromática, figurinha carimbada nas bandejas do forno. O balcão também fala a língua do dia a dia, com pedaços por peso, supplì (bolinhos de arroz fritos, de formato alongado, recheados com mozzarella e molho de tomate), panini e a célebre pizza de batata com porchetta, combinação que o lugar executa com precisão. Vale comer em pé, ali fora, quando a bianca ainda está estalando.

Forno Campo de’ Fiori (Campo de’ Fiori)
Padaria a cinco minutos de caminhada do Antico Forno Roscioli, é a quintessência do take-away da praça, com dois balcões, fatias cortadas do tabuleiro longo, pesadas e embrulhadas no papel pardo para comer em pé, encostado na fonte. É o lanche da caminhada, bem “praça do mercado”, ótima já pela manhã (sim, romanos comem pizza cedo, também). Peça uma rossa, com um véu de tomate e pontos de azeite que deixam a superfície luminosa, ou uma bianca coberta por lâminas bem finas de batata. Se tiver no dia, flores de abobrinha com anchovas são outro clássico do balcão.

A pizza Rossa da pizzeria Antico Forno Roscioli
Pizza Rossa da Antico Forno Roscioli | Instagram @anticofornoroscioli
Do rio às praças, o bairro boêmio de Trastevere preserva a Roma medieval em ruas estreitas e fachadas vivas
Do rio às praças, o bairro boêmio de Trastevere preserva a Roma medieval em ruas estreitas e fachadas vivas | iStock
Pinsa de flor de abobrinha e aliche da La Pratolina, em Roma
Pinsa de flor de abobrinha e aliche, na La Pratolina | Instagram @lapratolinaprati

Onde comer a pinsa romana
(oval, leve, digerível)

Il Ponticello (Ostiense)
Com um longo balcão e ambiente acolhedor, produz pizzas com massa leve, coberturas sazonais (inclusive opções vegetarianas e veganas), e fritti equilibrados. É o lado criativo do estilo pinsa, fora do circuito mais turístico. Entre as criações, a pizza 5 Pomodori usa, como o nome indica, cinco tipos de tomate, escolhidos para criar o equilíbrio ideal entre dulçor e acidez. O lugar é também conhecido pela seleção de cervejas artesanais.

Pinsere (Sallustiano/Barberini)
Balcão de verdade, fora da rota turística, que ensinou meio mundo a pedir pinsa por fatias. Brilha a massa oval de blend trigo–arroz–soja, com fermentação longa e crocância aerada, que aguenta coberturas generosas. A vitrine de mármore e vidro exibe as pinse do dia (alongadas, levíssimas) e o pessoal do balcão é daquele tipo que ajuda a escolher sem enrolação. As coberturas incluem clássicos como Margherita e Marinara, mas há também as criativas, com ingredientes como ricota, mel, passas e figos, ou a campeã local, com mortadela, ricota e pistache. Clima 100% “aponta–corta–pesa”, giro rápido perfeito entre Termini e a Via Veneto.

La Pratolina (Prati)
Pioneira da “nova” pinsa (no início dos anos 2000), virou símbolo do estilo no bairro. A base, fermentada por 48 horas, fica leve e elástica por dentro, crocante por fora, e sustenta coberturas parrudas. Um detalhe interessante é que a casa trabalha com queijos de toda a Itália, caso do robiola, combinado na Pinsa agli Agrumi com laranja-sanguínea, azeitonas pretas e manjericão fresco, compondo a fórmula ingredientes bons + ideia simples = resultado feliz. Nas noites amenas, as mesas sob a pérgula reforçam por que os romanos voltam sempre.

A pizza Super Provola e Pepe no Seu Pizza Illuminati
Super Provola e Pepe: tomates amarelos e vermelhos assados quebram a salinidade marcante do provolone com a ricota, no Seu Pizza Illuminati | Divulgação

Pizza contemporânea
(técnica moderna, alma romana)

Seu Pizza Illuminati (Trastevere/Porta Portese)
Laboratório contemporâneo de Pier Daniele Seu, com massa levíssima (fermentação longa, borda alta, miolo aerado) e coberturas autorais. A Amatriciana virou cartão de visitas (e motivo para conversões instantâneas de céticos). A experiência combina ambiente badalado, serviço afinado e cardápio que vai do clássico a ousadias calculadas, caso da Formaggi e Ananas (fonduta de parmesão, fior di latte, pecorino Gavoi e chutney de abacaxi com pimenta d’Espelette) e da Red Goat Chili Peppers (chicória, queijo de cabra, jalapeño, salame calabrês ‘nduja, pecorino di fossa). É esse equilíbrio, entre ideia arrojada e execução clássica impecável, que faz a casa brilhar. Fechou para reforma, com previsão de reabertura para setembro de 2025.

180gr Pizzeria Romana (Centocelle)
Com o chef Jacopo Mercuro, a tonda romana passou por um verdadeiro renascimento. Em síntese, disco baixo, crocância estudada e sabor que justifica a ida até Centocelle. A Capricciosa é a estrela assumida da casa, com tomate Gustarosso, mozzarella fior di latte, mini-alcachofras na brasa, azeitonas da Ligúria, cogumelos, ovo e presunto de Parma 24 meses. Faça como os locais e comece nos fritti. Na hora da sobremesa, peça sem arrependimentos a Fluffy, Fluffy, Fluffy, uma pizza-brioche em versão Mont Blanc, com chantilly de cumaru (cujo aroma lembra o da baunilha), compota de castanhas na brasa, marrons glacês e merengue de alecrim. Vale lembrar que Centocelle é Roma Leste com cena. O bairro gastronômico já foi considerado o mais cool da capital italiana pela revista Condé Nast Traveller, e La Cucina Italiana registrou a transformação recente do pedaço, que é perfeito para emendar a pizza com um giro pelos bares e mercados locais.

Sant’Isidoro – Pizza e Bolle (Prati e Trastevere)
Aqui a napolitana contemporânea ganha um par e tanto: bolhas na taça. A casa trabalha bordas altas e massa levíssima, e emparelha as redondas com uma carta viva de espumantes e Champagnes, ideia que virou assinatura e rende elogios unânimes. O ambiente é moderno, com serviço competente e pizzas entre as melhores da capital italiana, divididas no cardápio entre clássicas e eccentriche. Entre essas últimas, a Mazara leva camarões-vermelhos de Mazara del Vallo (DOP), queijo Stracciatella, creme de crustáceos e raspas de limão, e vai muito bem com um Champagne. Com matriz em Prati e filial em Trastevere, a Sant’Isidoro tem cardápio focado em napolitana de perfil leve. O resto fica por conta da sua curiosidade (e de uma boa taça). Reserve, porque costuma encher.

Napolitana contemporânea e espumante na Sant'Isidoro em Roma
Napolitana contemporânea e espumante na Sant’Isidoro: o par mais feliz de Roma | Instagram @sant_isidoro

A Pizza Carbonara da pizzaria romana 180gr
A Carbonara da 180gr e a arte de subverter: ovos mexidos, pancetta, creme de leite, Parmigiano Reggiano 36 meses, manjericão, salsa e pimenta Tellicherry | Instagram @180g_pizza
Ciro Salvo e a Margherita em estilo napolitano da 50 Kalo em Roma
Ciro Salvo sela a Margherita com azeite extra-virgem na aclamada 50 Kalò | Instagram @50kaloroma

Roma x Nápoles

O romano raiz continua fiel à scrocchiarella (tonda finíssima e crocante) e à al taglio (cortada e vendida por peso) do dia a dia. Mas adora uma boa napolitana quando a casa é séria. Basta olhar as filas nas novas napoletane de Roma.

Por quê? 

Porque o paladar romano curte forno forte e borda marcada (bordo fiammante). Isso casa lindamente com a napolitana bem feita, com centro macio e corniccione vivo.

Grosso modo, a autêntica pizza napolitana é individual, com disco de 22–35 cm, corniccione alto (de 1–2 cm) e centro macio (com espessura de 0,25–0,30 cm) após o forno. Massa só de farinha 00/0, água, sal e fermento, aberta à mão (nada de rolo) e assada em forno a lenha em cúpula a 485 °C por 60–90 segundos. Na Margherita, entram tomate pelado (de preferência San Marzano), mozzarella (fior di latte ou di bufala), manjericão e azeite; o alho é da Marinara (tomate, alho, orégano, azeite).

Quer ver romano raiz comendo pizza napolitana? Vá cedo em dias de semana a lugares como 50 Kalò, na Via Flavia, que virou referência rápida entre os locais, ou a Sant’Isidoro, que trouxe uma releitura contemporânea à napolitana, com base finíssima e corniccione cheio.

Na Piccolo Buco, você vai ouvir muito romanaccio (o romanesco em versão bem coloquial e cheio de gírias) nas mesas ao lado e muito “ooh!” quando chega uma Margherita com borda viva.

A Margherita di Burrata da Piccolo Buco, pizzaria em Roma
A Margherita di Burrata da Piccolo Buco: a dois passos da Fontana di Trevi, Roma flerta com Nápoles | Instagram @piccolobucoroma
Lungomare e Vesúvio, Nápoles
Lungomare e Vesúvio: o berço da pizza em panorama | iStock

Vale a esticada?

Se você realmente ama pizza, vale esticar até Nápoles, que, sabemos, é o berço da especialidade.

O bate-e-volta funciona (trens rápidos ligam Termini a Napoli em cerca de 1h10), mas uma noite por lá muda o relógio da experiência.

Com a pernoite, você prova mais, espera menos, caminha mais leve, vê o sol cair no Lungomare e entende que a Margherita nasceu ali por uma razão. 

Mas OK, se a agenda apertar, vá e volte no mesmo dia. Só não tente abraçar o Vesúvio em seis horas. Pizza boa gosta de forno quente e de viajante sem pressa.


Depois da pizza: onde ficar em Roma

Hotel Eden, guia de pizzas em Roma
Hotel Eden: emoldurada pela janela, a cidade se abre em telhados e pinheiros-guarda-chuva, com o Vittoriano no horizonte | Divulgação

Você já sabe onde morder, agora decida onde sonhar. Se a sua ideia é acordar olhando para a Escadaria Espanhola, a melhor escolha é o Tridente, conjunto de três vias que se abrem a partir da Piazza del Popolo (Via di Ripetta, Via del Corso e Via del Babuino), formando um leque que conduz ao coração histórico e elegante da cidade. É uma região nobre e prática. Você caminha pela Via Condotti, sobe ao Pincio para a vista que todo romano guarda no coração e, à noite, cai nas pizzarias do centro.

Pense no Hotel de la Ville, que combina posição no alto da escadaria com um rooftop de vista panorâmica; no irmão Il Palazzetto, micro-boutique com duas terrazze literalmente sobre os degraus; no Portrait Roma, com jeitão de “residência fashion”, a poucos passos da Via Condotti; e no Hotel de Russie, clássico com jardim interno entre a Piazza del Popolo e a Spagna. 

E para quem busca um design visionário, acaba de ser inaugurado o espetacular Romeo Rome, urban resort de alta arquitetura projetado por Zaha Hadid (1950-2016), instalado no Palazzo Capponi da Via di Ripetta, com vista para a Piazza del Popolo. Outro hotel com design incrível, o Bulgari Hotel Roma ocupa a Piazza Augusto Imperatore e rende passeios fáceis até o Pantheon e a Fontana di Trevi. 

Para quem prefere a elegância tranquila da Via Veneto/Ludovisi, ótima base para ir e voltar de um jantar de pizza, a escolha tem sabor histórico. Foi aqui que Fellini eternizou a Dolce Vita. Hoje, a região não é mais tão glamourosa quanto nos anos 1960, mas mantém um ar discreto e aristocrático, com jardins ao redor e calma rara para o centro de Roma.

Ali estão o histórico Hotel Eden (com vistas amplas, a poucos minutos da Villa Borghese), o W Rome (espírito jovem, rooftop com pizza e coquetéis) e o The Rome EDITION (design contemporâneo a poucos passos da Via Veneto).

O terraço do Bulgari Hotel Roma
Bulgari Hotel Roma: a cidade em tons suaves, com vista para a Villa Medici | Divulgação
Suíte do novo hotel Romeo Rome, em Roma.
Séculos de arte sob o teto no novo Romeo Rome, com afrescos restaurados e arquitetura de Zaha Hadid | Divulgação
Terraço da suíte do W Rome, em Roma
Terraço de suíte no W Rome: geometria pop e Roma ao fundo, pronta para o brinde | Divulgação

Já no Centro Histórico (Fontana di Trevi, Pantheon, Piazza Navona e Via del Corso), não há dúvida de que você estará no olho do furacão turístico. É mágico estar entre a Fontana di Trevi e o Pantheon, mas lembre-se que nenhum romano escolheria dormir ali, é território de visitantes. Para garantir conforto, o Umiltà 36 está a poucos passos da Fontana di Trevi, o Singer Palace tem terraço panorâmico, o Six Senses Rome aposta em rituais de banhos romanos no spa, e o G-Rough é o “não-hotel” artístico escondido atrás da Piazza Navona.

E, por fim, se a sua praia é bairro com cara de bairro, mire em Monti (com o Coliseu ao lado e o Quirinale por perto). Aqui se tem a vista cinematográfica para o Coliseu e, ao mesmo tempo, é um bairro boêmio-criativo, com antiquários, enotecas, trattorias e romanos de verdade circulando pelas ruas. O Palazzo Manfredi oferece aquela imagem de cartão-postal (terraço de coquetéis de frente para o anfiteatro), o recém-chegado Casa Monti Roma elevou o nível cinco-estrelas do pedaço (com bar no rooftop e espírito criativo) e a Villa Spalletti Trivelli funciona como uma townhouse histórica a poucos passos do Quirinale. Discreta, clássica e com alma romana.

Com essas dicas de hotéis na Cidade Eterna, crie o hábito de escolher o “seu” bairro como quem define o sabor de uma pizza, caminhar como quem folheia um cardápio e brindar cada scroc como quem agradece. A capital italiana, no fim, é isso. Uma cidade gigante em porções individuais, receita infalível de uma bela despedida. Leve na mala apenas uma regra: voltar com fome de Roma.

    UNQUIET Newsletter

    Voltar ao topo