Melodia Alpina

Mais um ano de Montreux Jazz Festival

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Nem parece que faz quase duas horas que o trem deixou a estação central de Zurique. A paisagem alpina, com tudo que ela tem direito – vacas vagando em pastos à beira de lagos quase infinitos e montanhas que parecem tracejadas ao fundo – me distrai enquanto devoro a salada Caesar, servida com uma taça de Chasselas – um dos melhores vinhos da Europa, só encontrado aqui e no Japão – a bordo do expresso que me leva até Lausanne.

No último ano, embarquei no trem da SBB (sigla local para Caminhos de Ferro Federais da Suíça) esbaforido, carregando uma sacola de sushi por receio de ter que encarar um sanduíche sem graça na viagem de quase três horas até Montreux. E assim que me acomodei no vagão da classe 1, me surpreendi com o menu completo oferecido pela empresa.

Moro em um país com excelente mobilidade e já estive em muitos que são referência em transporte, mas toda vez que piso aqui sinto uma invejinha do sistema de transporte suíço. É redundante, mas preciso registrar: não tem para ninguém, em matéria de viagens de trem, meu coração é vermelho e branco.

Primeira classe do trem da SBB | Foto: Reprodução SBB
Trem da SBB cortando os Alpes | Foto: Facebook SBB

Antes mesmo de desembarcar em Lausanne para trocar de trem e seguir para Montreux, sinto uma alegria inusitada. É até estranho imaginar que quase não venho ao Montreux Jazz Festival este ano. A correria do verão e um juramento feito com amigos após o trauma num festival de Barcelona que cresceu demais no último ano me fizeram repensar a frequência em festivais.

Para completar, o único grande evento musical que pisei esse ano foi um perrengue nada chique em Madri. Com péssima logística, demorei as mesmas três horas da viagem entre Zurique e Montreux do Bairro das Letras à malfadada Ciudad del Rock da capital espanhola. Talvez por isso a pontualidade e excelência de serviço suíços tenham em mim o efeito de um bálsamo nesta viagem. Ou seria só o peso dos anos?

Lago Léman | Foto: Erik Sadao

Lac Léman ou Mediterrâneo?

Desembarco em Montreux, e o coração se acalenta ao dar de cara com as placas que indicam o Montreux Jazz Festival. A galera que embarcou comigo em Lausanne impôs um fluxo que sigo até uma paisagem que conheço bem, revelando as primeiras barracas de comida e palcos montados em cima da água da excepcional estrutura do festival.

Na semana mais quente do ano, com termômetros registrando quase 37 graus aos pés dos Alpes suíços, é quase irresistível não querer se atirar no Lac Léman. O problema é que este ano não estou hospedado em Montreux, absolutamente lotada por causa do último final de semana do festival, e esqueci de colocar um short de água na mochila.

Como consolo, repito o ritual dos últimos anos, pedindo a mesma pizza coberta com emmental – e sem encantamento de primeira viagem, o queijo aqui tem outro sabor! – com uma cerveja bem gelada antes de mergulhar os pés no Lac Léman. A culpa por ter recusado um jantar num lounge organizado por um hotel da região desaparece. O rito que repito pelo terceiro ano é, para mim, a epítome do Montreux Jazz Festival, uma lembrança que quero ter para sempre.

A pizza | Foto: Erik Sadao
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Nile Rodgers e CHIC | Foto: Lionel Flusin
Lago Léman | Foto: Facebook Montreux Jazz Festival
Os pés | Foto: Erik Sadao
Pés na água para suportar os 37 graus em Montreux | Foto: Erik Sadao

Faltam quase três horas até que a lenda Nile Rodgers e sua lendária Chic subam no palco do Auditório Stravinski. Para matar o tempo e evitar as tentações gastronômicas com exemplares do mundo todo disponíveis na promenade de Montreux, sigo em direção à sala de imprensa do festival, não sem antes dar uma passadinha na boutique de merchandising e souvenires que, para minha sorte e surpresa, vende este ano uma bermuda de água e uma toalha de praia com o tema do Montreux Jazz.

Não demorou muito para que me convencesse de que consumir consciente é consumir o que se precisa. E no dia mais quente do ano, eu precisava de um mergulho no Lac Léman. Foi só entrar na sala de imprensa para guardar minhas coisas no locker e inspirar outros colegas jornalistas a fazerem o mesmo. Um conhecido escocês que cobre o evento todos os anos me diz que não entrou na água uma só vez, e só respondo que o termômetro marca 37 graus, lembrando que o primeiro show só acontece daqui a três horas. Além de consumir conscientemente, penso, ajudei a movimentar a economia de Montreux.

Sigo em direção ao palco da Accor, montado sobre a água, sem crachá, com toalha, camiseta e calção do evento, e não me surpreendo com a quantidade de frequentadores que teve exatamente a mesma ideia. Já nadei em lagos suíços antes, mas nunca havia sentido o tempero mediterrâneo que o Lac Léman exala hoje. Sentado nas pedras com os pés na água, me dou conta de que acabo de gerar uma nova memória do Montreux Jazz Festival que vai me atiçar a continuar a pisar aqui no mês de julho.

Antologia CHIC em Montreux

A água pura do Lac Léman é melhor do que qualquer ducha, e quando retorno para me trocar, já é quase hora do show do Nile Rodgers e da Chic. Meu amigo Kevin Donnet, responsável pela imprensa que cobre o festival, avisa que PRECISO ver o show do Mark Ronson. Ele sabia que havia escolhido o último dia do evento por causa da Chic, mas o show que o DJ e produtor fará no palco Montreux Jazz Lab será daqueles que entrarão no panteão de apresentações lendárias do Montreux Jazz. O motivo é que a banda responsável por “Back to Black”, mítico álbum de Amy Winehouse produzido por Ronson, se apresentará com ele num palco com projeções em uma tela que envolve a plateia, criando uma imersão de realidade aumentada. As dúvidas do libriano que vive se manifestam, mas Kevin resolve, trocando rapidamente minha pulseira por uma que dá acesso aos dois shows

Nile Rodgers | Foto: Lionel Flusin

Foi só o tempo de buscar uma cerveja antes que Nile Rodgers e a Chic tomassem o palco, já soltando “Le Freak”, “Everybody Dance”, “Dance, Dance, Dance”, obras-primas-disco originais da Chic; emendando “I want your Love”, “I’m coming Out”, produzidas para Diana Ross; “We Are Family”, de Sister Sledge, e “Like a Virgin” e “Material Girl”, de Madonna. Enquanto dançava quase em coreografia com estranhos, cantando os versos “living in a material world”, pensei que este seria o momento certo de escapar para dar uma espiada no Mark Ronson. Antes mesmo que me virasse de costas, os acordes de guitarra que abrem “Modern Love” do Bowie, do seminal álbum “Let’s Dance”, produzido para ele por Nile Rodgers no começo dos anos oitenta, começam a tocar. Claro, missão abortada.

Era como se a energia de Bowie estivesse ali. Pensei: eles vão mandar “Let’s Dance” em seguida, mas, para surpresa geral, a bateria e o baixo de “Cuff It”, uma das mais irresistíveis da renascença iniciada por Beyoncé no último ano, começa. E é a mesma euforia do show dela que toma conta do Stravinski. Um golpe surpresa nos atinge e, quando vejo, estamos cantando em coro o refrão de “Get Lucky” do Daft Punk, seguida por “Lose Yourself to Dance”, minha preferida do discão “Random Access Memories”, justamente por ser a faixa “mais Nile Rodgers” do álbum multipremiado do duo francês.

Marc Ronson | Foto: Lionel Flusin
Nile Rodgers | Foto: Lionel Flusin

Já faz mais de uma hora que a banda dispara hit depois de hit, impedindo de seguir meu rumo até o Montreux Jazz Lab ali do lado. Prometi ao Kevin que veria os dois shows que começaram com intervalo de meia hora. Quando “Spacer”, faixa setentista produzida para Sheila & B. Devotion, começa, saio correndo em direção ao Jazz Lab cantando que “he’s a spacer”. Mas antes que pudesse sair, “Soup for One” do Chic começa e, claro, emendam com “Lady (Hear Me Tonight)”, hit do começo dos anos 2000 do Modjo que usa o sample completo da faixa chillout dos setenta composta por Nile Rodgers. Novamente, missão abortada.

Com uma performance apoiada por um set list histórico, a Chic deixou uma reflexão típica dos veteranos sobre o que é talento e carisma, singelos, em um show onde a música é o que interessa. E para garantir que ninguém parasse de dançar nem por um minuto, ainda mandaram “Notorious”, do Duran Duran, e “Thinking of You”, de Sister Sledge. Perto do fim, quando todo mundo achava que só viriam clássicos da Chic, “My Feet Keep Dancing”, “Chic Cheer” e “My Forbidden Lover” foram intercaladas com “Let’s Dance”, inacreditável de se ouvir ao vivo, de Bowie, e, claro, “Rapper’s Delight”, de The Sugarhill Gang, num mashup com a base de “Good Times”, também da Chic, que me faz ir dançando de mansinho até perto da saída.

Os vocalistas, a banda e Nile Rodgers se despedem, e em meio às palmas efusivas, saio correndo com um sorriso no rosto em direção à rave soul armada por Mark Ronson. Sei que perdi “Uptown Funk”, do Bruno Mars; e algumas do “Late Night Feelings”, álbum de Ronson com faixas clássicas e vocais de Lykke Li, Angel e Miley Cyrus. Ainda atordoado pelo que a antologia CHIC que acabo de presenciar, sou pouco a pouco cativado pela banda que fez o álbum que imortalizou uma das vozes mais reconhecíveis desta época. “Valerie”, “Rehab” e, minha preferida, “Tears Dry On Their Own”, mesmo sem a presença física de Amy Winehouse, dão aquela aura de que essa noite, neste festival incrível, jamais será esquecida.

Se um dia voltar a jurar que não retorno mais a festivais, deixo aqui registrado, não estava me referindo ao Montreux Jazz Festival.

Por isso, até 2024, Montreux!

Agradecimentos: My Switzerland Brasil e Montreux Jazz Festival

Clique aqui para ver o registro da programação do Montreux Jazz Festival 2023.

Marc Ronson | Foto: Emilien Itim

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