Ninguém sabe como foi a primeira extração, mas certamente um punhado de azeitonas foi esmagado com uma pedra e um filete de óleo escorreu após certo tempo. Assim como o suco de uvas espremidas em alguma cavidade deu origem espontânea ao vinho, o azeite é um milagre do acaso pelas mãos humanas. E já são milênios de história desse bem precioso, usado na alimentação, em produtos cosméticos, massagens, rituais religiosos, como remédio popular e até na iluminação de ambientes em outras eras. Hoje espalhado por várias regiões do planeta, ele é um ícone do bom gosto na gastronomia e marcas de vários países procuram seduzir os consumidores com aromas e sutilezas de sabor.
O crescimento da produção e do consumo foi impulsionado pela mecanização da extração do azeite, um processo peculiar que se iniciou na Antiguidade, com as azeitonas sendo esmagadas em pilão de pedra juntamente com água quente, passando para os rolos de pedra em um moinho circular até chegar à prensa e à centrifugação, processos modernos para extrair e separar a pasta de azeitona do óleo. Como seria de esperar, a inteligência artificial já está chegando ao campo em pesquisas feitas na Itália e na Espanha, com algoritmos que analisam os padrões climáticos durante o período do ciclo de cultivo da oliveira, determinando o melhor momento para a colheita.

Todos esses cuidados são necessários, sobretudo, para a produção dos melhores azeites extravirgem, aqueles prensados a frio – expressão relacionada aos métodos artesanais, quando as azeitonas são processadas a uma temperatura de até 27 ºC. Isso permite ao azeite manter seus principais nutrientes, gorduras saudáveis e antioxidantes, que, está provado, atenuam o envelhecimento e protegem a saúde cardiovascular, sendo uma das bases da dieta mediterrânea.
Outro ponto importante se refere ao teor de acidez, algo que deve sempre ser verificado no rótulo no momento da compra. Pela legislação internacional, o azeite extravirgem deve ter uma acidez inferior a 0,8%. Um índice menor que esse significa que a extração foi feita com azeitonas em um bom ponto de maturação e de forma cuidadosa, da colheita ao processamento.


O cultivo da oliveira sempre foi associado ao clima mediterrâneo, com bastante sol, temperaturas quentes no verão, invernos amenos e solo bem drenado, o que acaba por traduzir o ranking dos maiores produtores de azeite do mundo: Espanha, Itália, Grécia, Turquia, Tunísia, Portugal e França. A eles se juntam Marrocos, Argélia, Síria e Egito, em menor proporção. Por muito tempo, acreditou-se que outras regiões não seriam adequadas ao plantio, mas Argentina, Chile, Austrália, Estados Unidos, Japão, China e Brasil entraram no clube com variedades tradicionais, como Arbequina, Grappolo, Koroneiki, Frantoio, Coratina, Verdeal, Manzanilla, Picholine e Hojiblanca. Existem mais de 2 mil variedades no mundo, mas essas são as mais utilizadas.

Viajando com os melhores
Uma viagem atrás dos melhores azeites nos leva de imediato a Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, com marcas premiadas em concursos internacionais, como Orfeu, Mantikir, Sabiá, Prosperato e Verde Louro, todas com perfil tropical, de acidez baixa. E também a países vizinhos, como a Argentina, onde, em Mendoza, oliveiras adjacentes a vinhedos dão origem ao Zuelo by Zuccardi, elaborado com práticas sustentáveis. E o Chile, que possui condições climáticas e de solo próximas às da região mediterrânea, onde se destacam produtos premium das empresas Deleyda e Las Doscientas. Com exceção de Las Doscientas, todas as outras marcas citadas permitem visitas ao lagar, com degustações e palestras sobre o “ouro líquido”.
Próxima parada: Grécia, um dos berços históricos do azeite, com oliveiras ancestrais, método de extração a frio e sabores profundos, como os da The Governor, produzidos na Ilha de Corfu, e da Liá, em Messinia. Ambas recebem para imersões no campo, extração e degustação. Na Turquia, variedades autóctones, como Ayvalık, Memecik e Trilye, geram bons azeites, como Novavera e Yudum Egemden.


O Marrocos também é herdeiro de influências fenícias e romanas, com plantações em Meknès, Marrakech, Fès, Ouazzane, Rabat e outras regiões, com marcas fortes, como Noor Fès et Zouitina. A Argélia se destaca na região de Djelfa, com os azeites Baghlia e Ardhi, enquanto a Tunísia, com um cultivo orgânico expressivo, se destaca com produtos como Fendrihuile, na região de Sfax, Adonis, em Testour, e Olivko, em Béja. A Síria, um tradicional produtor, ainda sofre as consequências de conflitos recentes e incertezas em sua exportação. No Egito, de múltiplos usos do azeite na época dos faraós, o cultivo hoje é quase todo voltado para a azeitona de mesa, mas a produção do óleo está em crescimento.
Já a Provença, a bela região do sul da França, mantém sua tradição secular, com muitos rótulos de nicho, entre eles Château d’Estoublon, Moulin des Costes e Moulin Castelas, esses dois últimos com degustação local e venda. A Espanha, o maior produtor mundial, com extensos olivais cobrindo boa parte da Andaluzia, exibe rótulos de prestígio, como Castillo de Canena, Oro del Desierto e Dehesa El Molinillo, este em Castilla-La Mancha. A Itália se destaca na Toscana e na Lombardia, com seus extravirgens de cultivares históricos e frutados intensos, como o Frantoio Franci e o Comincioli, ambas aziendas com degustações sob reserva. Portugal, que consagra o azeite na culinária, produz principalmente no Alentejo e em Trás-os-Montes e tem boas marcas, como Herdade do Esporão e Carm, orgânicos.


A degustação
Assim como o vinho, os aromas e sabores são determinantes ao provar um azeite. A única diferença é a cor, que não importa muito na avaliação (verde ou dourada), pois depende da variedade utilizada. Por isso, os degustadores profissionais usam pequenos copos azuis ou vermelhos para não ser influenciados por ela e se concentram nas características aromáticas, com o frutado revelando azeitonas saudáveis e frescas, verdes ou maduras, que podem lembrar ervas, grama recém-cortada, tomate, casca de banana, nozes, castanhas ou maçã.
Na boca, a ardência (a sensação de formigamento no palato e na garganta) é própria dos azeites produzidos no início da safra, com azeitonas ainda bem verdes, enquanto o amargor é elementar e característico do azeite obtido a partir de azeitonas maturadas ou em processo de maturação. Escolher vai do gosto adquirido de cada um, com os mais simples sendo usados no cozimento e os mais intensos e aromáticos sendo ideais para ser adicionados à comida, fria ou quente, no último momento. Prazer garantido!
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