Consciência e cura

Em uma reserva ecológica inexplorada de Florianópolis, o Instituto Seiva sedia retiros de renovação do corpo e da mente, por meio de experiências e rituais de culturas ancestrais, e uma gastronomia viva, com ingredientes naturais e locais

Em um território de onde emergem nascentes, cachoeiras e árvores centenárias, uma figueira majestosa, praticamente uma entidade, nos recebe. Por suas belezas naturais, o Instituto Seiva, encravado no sobe e desce de uma montanha ao sul de Florianópolis, é um refúgio verde para as mentes inquietas. Mas sua vocação vai além, alcançando a busca do ser humano pela reintegração consigo mesmo, com a terra, com o espírito.

Acessível por um curto trecho de estrada de terra, a área, de 15 hectares, pertence à reserva biológica da Lagoa do Peri, um patrimônio de água doce que abastece a maioria dos bairros do sul e do leste da ilha – de um dos mirantes da propriedade, aliás, consigo avistar o manancial, depois de uma curta caminhada morro acima. Ali, converso com Angela Prazeres, uma das três proprietárias do Seiva. Mineira de Belo Horizonte, ela se mudou para Floripa nos anos 2000 para trabalhar com projetos socioculturais e ações de preservação da cultura dos povos indígenas. Em 2016, descobriu a fazenda à venda. “Aqui era um pasto. O solo estava bastante degradado”, recorda.

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Mandala no interior do domo geodésico
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Ritual de tambor xamânico para meditação

Com uma visão holística, o Seiva promove vivências de renovação do corpo e da mente

Embora vislumbrasse potencial, Angela consultou o pajé Bane, um velho amigo da etnia Huni Kuin, que habita o Acre, na fronteira com o Peru. Guarde esse nome: o líder indígena integra a essência do Seiva desde que fez a primeira prece, em uma das nascentes. A segunda bênção veio meses depois e, dessa vez, debaixo da figueira. “Foi quando a energia aflorou de forma positiva. Começamos a nos conectar com a terra, com o mínimo de agressão e o máximo de sustentabilidade”, pontua Angela.

Florescimento orgânico

Foi valiosa a inspiração do arquiteto Marcos Frugoli, um dos responsáveis pela criação do Parque Municipal Lagoa do Peri, nos anos 1980. Ao projetar o paisagismo do Seiva, o profissional optou por um projeto que ele chama de “desenho invisível”, sem o uso de cimento ou qualquer outro elemento rígido, como muros e pilastras. “Potencializamos o que já existia, com traços arquitetônicos efêmeros, para passar a sensação de que não foi feito nada, embora o visual tenha sido muito modificado”, descreve.

Em um movimento silencioso e determinante, o instituto capitaneou o replantio de 1,5 mil mudas nativas, reduzindo o assoreamento das nascentes. Já a sustentabilidade simbólica se manifesta por meio do domo geodésico, a principal estrutura “humana” do Seiva. Sem pilares internos, a cúpula esférica, composta de uma rede de triângulos interligados e cobertura inflável, se ergue sobre uma base de madeira e pode ser desmontada, sem prejuízo para o solo.

Por fim, os núcleos de convivência, cercados por mesas e bancos de madeira e artefatos indígenas e orientais, são ligados por “caminhos” de pedra, uma espécie de “diálogo” entre a natureza e a mão humana.

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Domo geodésico do Instituto Seiva

Contempla-te a ti mesmo!

Dentro dessa visão holística, o Seiva promove vivências de renovação do corpo e da mente, com datas abertas ao público, ou sob demanda, para grupos particulares. “Iniciamos com uma aula de ioga gratuita para as comunidades locais. Isso gerou um movimento voluntário, que culminou na Feira do Sertão: os artesãos montam estandes com produtos ecológicos e sustentáveis, de cosméticos a arte e comidinhas”, diz Angela. As experiências também incluem temezcal (a sauna asteca), danças, plantio de mudas, massagens, trilhas meditativas e concertos musicais, entre outras atividades (em nenhuma delas se permite o uso de álcool).

Nesse cardápio zen, sou atraído pela terapia do som (sound healing). Por meio de instrumentos musicais ancestrais, como a flauta nativa americana e a chakapa peruana, a técnica induz à meditação. “Os sons evocados atingem os níveis moleculares do corpo, ajudando a desacelerar a atividade mental, reorganizar a parte emocional e até mesmo tratar a apneia”, afirma o terapeuta holístico Alexandre Henrique.

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Sala de ioga
Pajé Bane

Uma sessão de ioga, conduzida pela iogue Sabrina Baby, faz dupla com a terapia do som. É a chamada chakra yoga, uma sequência de posturas focada no sétimo chacra, a Coroa (sahasrara em sânscrito), localizado no topo da cabeça e considerado o ponto de conexão com o divino. “Com a prática constante, o paciente aprende a se conhecer, a reagir contra tudo que o afeta negativamente e desequilibra sua energia vital, a entender os vários aspectos de sua natureza e a maneira de modificá-los”, descreve a instrutora, que é formada em ayurveda pelo Chopra Center, na Califórnia.

Na sequência, participo de um “concerto” de cantos védicos, mantras em sânscrito dos Vedas, os textos sagrados milenares da Índia. A terapeuta holística Beatriz Silva conduz esse ritual de forma delicada, explicando o sentido de algumas palavras, como moksha, a “busca pela libertação”. Os Vedas nos revelam que cada indivíduo é pleno, completo e ilimitado. A partir do momento em que percebemos isso, conseguimos acomodar nossas limitações e nos libertamos do medo, da necessidade do ‘ter’”, diz. Deixo-me ser conduzido pelo rito e busco a harmonização dos chacras e dos doshas. Como propõe o namaste, saúdo e reverencio o divino e a luz presentes em mim, no outro e na natureza.

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Mesa Viva, área de alimentação do Seiva

Comida viva

No Seiva, as refeições também buscam reconectar os sentidos. Para o almoço, a Mesa Viva das culinaristas Bruna Hey e Maria Tereza Finotti apresenta um menu intuitivo, com insumos e produtos locais. Exemplo disso são as hortaliças colhidas em Paulo Lopes, uma pacata cidade na região metropolitana de Florianópolis, e os queijos de castanhas, nas variedades brie e camembert, da produtora Queiju.

Chamam-me a atenção as influências cosmopolitas da refeição, como o homus de beterraba, o palmito crocante com maionese de wasabi e a couve-flor assada ao molho romesco, típico da Catalunha, à base de pimentão e tomate. A torta de geleia de frutas amarelas, com ganache de cacau e massa de baru e butiá, fecha o banquete com louvor.

Todos os restos de alimento são compostáveis, ou seja, lixo zero. Embora talheres estejam disponíveis, somos incentivados a comer com as mãos. “É um estímulo ao tato. Nós estamos abandonando o ‘sentir’, pois terceirizamos as funções do nosso corpo”, observa Bruna Hey. Para limpar as mãos e a boca, há guardanapos de folha de boldo, uma espécie de “veludo orgânico” – e biodegradável, evidentemente.

Sabedoria ancestralO pajé Bane, a entidade indígena que fez a bênção inicial no Instituto Seiva, está presente nesse retiro – desde a primeira prece, ele viaja pelo menos duas vezes por ano até o local para ministrar a medicina da floresta. Nessa noite, ele faz as celebrações hãpaya e nixipae. Para além dos mistérios do idioma Hãtxa Kuin, o pajé assegura que esses rituais são a porta para a cura individual – ou seja, não são formatados como um “produto” para isso ou para aquilo. O trabalho é alinhado com a cultura ancestral dos Huni Kuin, em profunda conexão com a natureza, os caboclos e os seres encantados da floresta.

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Massagem terapêutica no deck da figueira ancestral

Ainda é dia e tempo de fazer uma trilha meditativa, em silêncio, rumo ao mirante da Lagoa do Peri, acompanhado do pajé e dos instrumentos de sound healing. A cada ressoar do toque de tambor lakota, feito de couro de cabra, somos convidados a parar, prestar atenção na respiração e observar o Sol. Quase ao crepúsculo, de frente para a lagoa, o pajé Bane entoa cânticos indígenas. “Peço pela terra, pelas pessoas. Convoco os espíritos da floresta para ajudar a fazer fluir a energia”, diz ele.

Em uma abordagem multicultural, a sabedoria xamânica também chega ao Seiva por meio da cerimônia do cacau – ou tchocoatl, como a bebida, considerada divina, era chamada pelos maias. Preparada pela iogue Iza Maia, a receita leva pó de rosas, o que atenua o sabor amargo e denso da semente. “A endorfina anandamina, produzida naturalmente após um exercício físico intenso, só foi encontrada em uma planta: o cacau. O nome vem do sânscrito ananda, e ela é conhecida como o neurotransmissor da felicidade”, diz Iza. 

Aproveito essa conexão com o elixir consagrado para também me reconectar com os sentidos e com o meu eu interior. É o momento do despertar de novas consciências e tomada de decisões. Finalizo o dia com a sensação de limpeza energética, de abrir o campo de percepção de dentro para fora. Uma intervenção libertadora.  

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Mirante da lagoa do Peri
Natooh Guest House

Entre a mata e o mar

A Naatooh Guest Houses é uma mansão dos anos 1980 encravada na pedra, defronte para o mar de Santo Antônio de Lisboa, um antigo povoado açoriano. Chancelada pelo Circuito Elegante, a propriedade recebe o hóspede como um velho amigo: com aconchego e sem cerimônias. O desjejum, por exemplo, estende-se até 17 horas, sempre com flores-do-campo à mesa. O jantar, à meia-luz, tem um tom intimista. O chef Fernando Martins serve pratos leves, como carpaccio de beterraba com borsin e amêndoas caramelizadas, risoto de abóbora cabotiá e a inusitada tapioca de café com sorvete de butiá. A propriedade abriga apenas seis acomodações – três suítes, duas vilas e um bangalô, equipados com banheiras e ofurôs. Todos têm vistas para o mar, entremeado pela Mata Atlântica, mas a visão mais impactante é a partir do elegante lounge, no lobby. O décor, planejado pessoalmente pela anfitriã, Bárbara Guedert, preza por peças indígenas e de artesãos e por mobiliário de vime. Aliado a conceitos ESG, o Naatooh cuida da fauna e flora locais e reduz o uso de plástico ao máximo, com amenidades em frascos de vidro e embalagens de papel reciclado. 

circuitoelegante.com.br 

Matéria publicada na edição 12 da Revista UNQUIET.

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Não utilizam garrafas plásticas e optam por alternativas sustentáveis.

Os amenities de banho são fornecidos em dispensers sem embalagens plásticas, para reduzir o impacto ambiental.

Shampoos, condicionadores e sabonetes, compostos por formulação biodegradável,

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Redução do uso de papel e impressos e busca por alternativas digitais sempre que possível.

 

Ilustração: Antônio Tavares

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