Eu abaixo a cabeça, assustado com o voo rasante de um morcego, que parece não acostumado a visitas noturnas nesses confins florestais da América Central. Passa das 22 horas nas ruínas de Uaxactun, um desconhecido sítio arqueológico maia no norte da Guatemala. Ainda ressabiado depois de ter visto uma cobra na trilha, ilumino meus pés com a luz da lanterna de cabeça para estar seguro de onde piso. Mal posso acreditar quando me deito para contemplar o céu estrelado. Absorto pelos sons dos macacos uivantes e das cigarras na mata, relaxo em um terraço de pirâmide de um dos mais antigos observatórios astronômicos do planeta, entre construções que datam por volta do ano 500 a.C. A civilização maia floresceu há 3 mil anos e dominava saberes como a astronomia, a arquitetura e a escrita. Organizada em cidades-estados, espalhou-se pelo território onde hoje ficam Guatemala, Belize, Honduras, El Salvador e México. É parte dessa fascinante Rota Maia que estou descobrindo, feito um Indiana Jones, em uma jornada de três semanas.
Os Maias não desapareceram
Primeiro dos nove sítios arqueológicos da minha Rota Maia, o povoado de Uaxactun foi reconhecido pelas Nações Unidas como a Melhor Vila Turística de 2024 por encantar os poucos visitantes com experiências de viagem conduzidas pela própria comunidade. Da história à gastronomia, dos rituais ao artesanato, meus anfitriões, Carlos Vivar, Dominga Choc e Eswin Nuñez, apresentam orgulhosamente a herança maia, de antepassados que sempre ocuparam aquelas terras. “Mais de 40% da população da Guatemala se reconhece como maia, falando mais de 20 línguas, o que mostra que nossa cultura continua viva”, diz Carlos. A afirmação contradiz a lenda de que essa civilização poderosa ‒ que no auge do Período Clássico, nos anos 900, pode ter tido 15 milhões de habitantes ‒ teria deixado de existir subitamente. “O mistério é o esvaziamento das grandes cidades, que realmente foram evacuadas”, conta Dominga. “Mas nosso povo nunca morreu.”








La Lancha – The Coppola Hideaways
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Ritual do fogo sagrado
A cultura maia se mostra rica desde o início da minha viagem, uma semana atrás, quando desembarquei do voo na Cidade da Guatemala e passei a visitar, por terra, o sul do país. Na charmosa Antigua, a capital até 1776, provo as influências dos povos originários que se fazem presentes na culinária: as tortillas de milho são o prato do dia desde antes da invasão dos colonizadores espanhóis, nos anos 1520. Considerado “o umbigo do mundo” pelos maias, o lindo Lago Atitlán mescla elementos de rituais milenares com imagens cristãs nas igrejas e nos mirantes de seus povoados. E Chichicastenango, a sede do maior mercado de rua da América Central, vive colorida pelos huipiles, os trajes tradicionais das mulheres. Perto da feira, participo de uma típica cerimônia de agradecimento em volta do fogo, conduzida pelo xamã maia Miguel León, nos fundos de sua humilde casa. “Aprendemos com os ancestrais a queimar velas, incensos, doces e bebidas alcoólicas em oferenda aos espíritos da natureza que nos protegem”, conta.

Aventura no vulcão Acatenango
Considerados sagrados pelos maias, os 37 vulcões da Guatemala embelezam a paisagem e instigam os viajantes bem preparados a encarar o desafio de subir até o topo. A partir de Antigua, escolho atingir o Acatenango, com desafiadores 3.976 m de altitude. O trecho final da dura subida serve de mirante para o vizinho Fuego, um vulcão ativo, que frequentemente expele lava, fumaça cinza e sons de explosões. A experiência de contemplar a boca incandescente do Fuego em meio às estrelas e ver o Sol nascer do topo do Acatenango é tão fascinante quanto amedrontadora. Não por acaso, os antigos maias entendiam as erupções como sendo um sinal da ira dos deuses e faziam rituais para apaziguá-los.



Tikal, no coração do mundo maia
São 4 horas de outra manhã quando pego a pulseira de acesso para realizar o sonho de adentrar o lugar que me atraiu até aqui: Tikal. Uma das mais poderosas metrópoles maias, esse sítio arqueológico, eleito como um Patrimônio Mundial pela Unesco, começa a revelar, ainda na escuridão, suas construções espetaculares. Para chegar, tive que voar desde a Cidade da Guatemala até a pequena Flores, base para explorar Petén, a principal região arqueológica do país. Depois de percorrer os primeiros quilômetros de trilhas do Parque Nacional de Tikal, vejo os monumentos do Período Clássico (entre os anos 300 e 900) se agigantarem na minha frente: com cerca de 40 m de altura, os Templos do Grande Jaguar e das Máscaras se confrontam, em lados opostos da clareira cerimonial Gran Plaza. Subo os 60 m do Templo IV, ao som das aves, para ver o Sol dourando o topo das pirâmides, que vou visitar por dois dias. Elas despontam na mata da Reserva Maia da Biosfera.

Revolução na arqueologia
“Sabemos hoje muito mais sobre os maias do que dez anos atrás”, diz Milton Lopez, guia há 16 anos, enquanto caminhamos por Yaxhá, outro belo sítio arqueológico nas redondezas. Milton narra histórias sobre sacrifícios humanos, jogos de bola maias e calendários enigmáticos, além de detalhar a revolução na arqueologia gerada pela tecnologia Lidar. Desde 2016, o “escaneamento a laser” da floresta, feito em sobrevoos, gera imagens que removem de forma digital a cobertura da mata, revelando tridimensionalmente o que há de concreto no solo: pirâmides, muros, cidades inteiras. “Descobrimos 8 mil quilômetros quadrados de assentamentos maias na última década. Dezesseis vezes mais do que os 500 km² encontrados em mais de 100 anos de pesquisa”, estima Francisco Estrada-Belli, arqueólogo da National Geographic Society, que vi palestrar em Antigua dias antes. Italiano radicado na Guatemala, Francisco achou relíquias valiosas em sítios como Holmul e Chochkitam, onde conduz tours exclusivos em suas escavações. O turismo arqueológico no território maia permite que viajantes curiosos possam visitar, em voos de helicóptero ou trekkings de quatro dias, o remoto El Mirador ‒ um sítio maior e mais antigo que Tikal, pois data do período Pré-Clássico Maia (entre os anos 1000 a.C. e 300 d.C).



Esqueleto na caverna
Com minúsculas conchas em forma de caracol encontradas no solo, o sítio arqueológico de Caracol, já em Belize, foi um dos pioneiros no uso do Lidar para estudos arqueológicos, ainda em 2009. Na terceira semana da viagem, cruzo a fronteira terrestre a partir da Guatemala para visitar Caracol e também as ruínas da vizinha Xunantunich. A maior surpresa, porém, não está na superfície, mas no subterrâneo. Não tão longe dali, ao entrar na caverna ATM, a abreviatura do nome maia Actun Tunichil Muknal, entendo por que esse sítio arqueológico está no topo da lista mundial de cavernas sagradas a serem visitadas, segundo a National Geographic. Para explorá-la, preciso caminhar por uma trilha que cruza três rios, com água na cintura, entrar nadando pela boca da gruta e me desviar de estalactites e estalagmites por mais de três claustrofóbicas horas. Ao fim da saga, entre morcegos e aranhas, encontro intactos esqueletos, crânios e vasos cerimoniais datados do ano 900. Mais Indiana Jones, impossível.

Bênção nas águas dos cenotes
A ciência não sabe o que causou o esvaziamento das cidades maias pré-colombianas. Podem ter ocorrido desafios ambientais, como a seca, ou conflitos entre etnias. O certo é que os maias subiram rumo ao norte, para a Península de Yucatán, no México. Por terra, sigo esse rastro até os últimos assentamentos maias, no país vizinho, que recentemente passou a conectar vários parques arqueológicos com o Tren Maya. Tulum, a única ruína à beira-mar, e a monumental Chichen-Itzá, mais turística, datam do Período Pós-Clássico, contado desde o ano 900 até a chegada dos espanhóis, no início dos anos 1500. Ambas são rodeadas pelos cenotes, como são chamados os mais de 7 mil poços de água doce e cristalina, muitos deles em cavernas, que só existem em Yucatán e também eram sagrados para os maias. Mergulho em dois deles – Dos Ojos e Ik Kil ‒, antes de pegar o voo de volta de Cancún ao Brasil. Como aprendi com os maias, ritualizo e agradeço os espíritos da natureza pela dádiva de estar em sua terra sagrada.
Aventura com conforto
Testamos dois incríveis hotéis butique à beira do Lago Petén Itzá, a base para conhecer os principais sítios arqueológicos da Guatemala, como Tikal. O refinado Bolontiku, da Cayuga Collections, com quartos e piscina de encher os olhos, e o La Lancha, da The Family Coppola Hideaways, que capricha na decoração cinematográfica com arte maia selecionada a dedo por Eleanor, a esposa do cineasta.
Eterno mito do cinema, Francis Ford Coppola ama tanto a região que é o poderoso chefão de outros três hotéis na vizinha Belize. Sua casa de campo fica na Reserva de Mountain Pine Ridge. Também com uma carta de vinhos de sua própria vinícola no restaurante, o Blancaneaux Lodge é o ponto de partida para Xunantunich, Caracol e a caverna ATM. Uma desviada para o litoral sul leva à pacata Placencia, onde o Turtle Inn estende a qualidade Coppola aos cênicos bangalôs à beira-mar.



Já no sul da Guatemala, o histórico Hotel Atitlán fica em um recanto tranquilo de Panajachel, de onde saem os barcos para os povoados maias tradicionais. Com jardim e piscina espetaculares à beira do Lago Atitlán, a antiga fazenda de café se diferencia pelo estilo colonial.
Para desenhar roteiros sob medida pela Rota Maia, na América Central e no México, a operadora Beyond Viaventure é a mais reconhecida. Ela organiza tours de helicóptero para conhecer El Mirador e de 4×4 para Holmul, tendo como guia o arqueólogo Francisco Estrada-Belli.
Matéria publicada na edição 21 da Revista UNQUIET.

La Lancha
Energia
- Monitoramento das contas de energia para avaliar a eficácia das iniciativas de conservação.
- Avisos aos hóspedes sobre economia de energia (iluminação e ar-condicionado).
- Lembretes também em áreas administrativas e de funcionários.
- Redução de custos mensais de energia.
Água
- Conscientização sobre a escassez mundial de água e importância da conservação.
- Estímulo ao uso racional da água com lembretes para hóspedes.
- Incentivo à reutilização de toalhas quando não estão sujas.
- Uso de soluções ecológicas na lavanderia para reduzir produtos químicos.
Resíduos
- Sistema de gestão de resíduos baseado em reduzir, reutilizar e reciclar.
- Separação de plásticos, garrafas e restos de alimentos.
- Entrega dos resíduos separados para equipe de gerenciamento de lixo da cidade mais próxima.
Reuniões verdes
- Participação em comitê que protege o lago e a biosfera local.
- Promoção de reuniões e conferências sustentáveis:
- Minimização de resíduos.
- Compensação de carbono.
- Uso de produtos recicláveis e compostáveis.
- Serviços de alimentação com produtos reutilizáveis (porcelana, guardanapos de tecido).
- Enfoque em ecoturismo e culinária local/orgânica.
Construção sustentável
- Uso de materiais renováveis: madeira, calcário triturado e palha natural.
- Construções planejadas para resfriamento natural e menor impacto ambiental.
- Padrões elevados de sustentabilidade.
- Evita-se o corte de árvores para manter a harmonia ambiental.
Compras sustentáveis
- Preferência por fornecedores e produtos locais.
- Uso de produtos de limpeza biodegradáveis.
- Apoio à economia local e criação de mercado sustentável em Guatemala.
- Aquisição local de alimentos, móveis e itens de loja de presentes.
- O dinheiro gasto permanece nas comunidades locais, fortalecendo-as.
Promoção da economia local
- Apoio ativo a projetos de desenvolvimento comunitário.
- Parceria com comunidades locais para aproveitar o turismo de forma positiva.
- Campanhas regulares de limpeza das margens do lago com participação dos funcionários.
- Colaboração com famílias maias em experiências gastronômicas e educativas.
Engajamento dos funcionários
- Programas de conscientização ambiental e treinamento contínuo.
- Boas condições de trabalho, remuneração justa e oportunidades de capacitação.
- Priorização de emprego local e formação profissional.
- Incentivo aos hóspedes a utilizar guias e serviços locais, distribuindo benefícios econômicos.
Conservação
- Apoio financeiro a grupos de resgate animal (ARCAS):
- Doação de US$ 1 por garrafa de água vendida.
- Proteção de animais vítimas de maus-tratos e caçadores ilegais.
Educação dos hóspedes
- Informações em quartos e passeios sobre turismo responsável.
- Conscientização sobre redução de impacto ambiental durante as visitas.
- Incentivo à preservação de recursos naturais e respeito às comunidades locais.
































































































































































