Se hoje muitas cidades disputam o título de capital gay, há cem anos não haveria a menor dúvida na resposta: Berlim. Boa parte do que entendemos atualmente como identidade de gênero, orientação sexual e direitos LGBTQIA+ nasceu e tomou forma na capital alemã: a primeira publicação gay, o primeiro centro de pesquisas sobre sexualidade humana, a primeira organização de luta por direitos de homossexuais, as primeiras cirurgias de redesignação sexual e a lista segue.
Essa história pode ser revisitada no também primeiro museu dedicado à cultura LGBT, o Schwules Museum, cujo gigantesco acervo cobrindo fatos, artistas e publicações do mundo todo. Tive acesso para pesquisa dias antes do seu fechamento por conta da pandemia.
Passados os traumas da ascensão do nazismo, que exterminou homossexuais em campos de concentração, da quase completa destruição e da cruel divisão pelo muro, Berlim emergiu depois da reunificação como novo polo para artistas, música, tecnologia, gastronomia orgânica e uma das melhores noites do planeta. Nesse último quesito vale acrescentar ‘sem limites’, já que não faltam opções para quem curte uma onda mais kinky. Quase todos os clubes têm noites temáticas, com públicos, digamos, diferentes. Para não chegar em uma festa com uma especificidade que não seja a sua, verifique antes de ir. Ou simplesmente se abra para novas experiências.
Foi assim, desavisado, que caí no popularíssimo clube de fetiche KitKat Club, um berlinense, em noite com dress code que não fazia parte do meu guarda-roupa. A solução apresentada pela hostess foi tirar toda roupa, o que acabei fazendo a despeito da noite gelada de outono. Ainda assim, valeu a pena.
Outro ícone da noite é o Berghain, considerado o melhor clube de música eletrônica do planeta, famoso pelas gigantescas filas, pelo door que barra sem mais explicações, e pelas baladas que começam na sexta e vão até segunda. Uma maneira de evitar ser barrado é dar uma passadinha antes no Lab.oratory, imenso clube para visitantes sexualmente mais ousados, que fica no mesmo complexo, ser carimbado como se fosse sair para fumar e entrar direto no clube, evitando a fila.
Schöneberg é o histórico bairro gay, com bares, restaurantes, lojas e clubes com entrada permitida apenas para homens – a maioria mais velhos e com acessórios de couro. Mais jovem e alternativo é o bairro vizinho de Kreuzberg, que vem resistindo ao processo acelerado de gentrificação e mantém o espírito indie. Uma instituição da cena queer local é o Roses, bar minúsculo na agitada Oranienstraße acarpetado de rosa até o teto, onde aglomerar não é uma opção.
O vizinho Möbel Olfe é um dos bares gays (lésbico às terças) mais célebres da cidade. É lá onde costumo bater ponto assim que chego em Berlim…
Pride e Festivais:
A parada do orgulho LGBTQIA+ de Berlim é conhecida como CSD, iniciais de Christopher Street Day, referência ao endereço do bar Stonewall Inn de Nova York , onde aconteceu a revolta em 28 de junho de 1969 que marca o início do movimento por direitos LGBT. CSD acontece sempre na segunda semana de julho. Outro marco LGBT é o Teddy Awards, seção de filmes da temática na Berlinale, o festival internacional de cinema de Berlim.
Essencial Proudly UNQUIET:
Na linda Husemannstraße, no já gentrificado bairro de Prenzlauer Berg, fica o tradicionalíssimo November, café que se assume gay (mas que tem público bastante eclético) com atmosfera dos tempos da Alemanha comunista e ótima música. Especialmente popular no brunch aos domingos.
Onde Ficar:
Das Stue
Hotel boutique em sua máxima expressão, o Das Stue está instalado na antiga sede do consulado escandinavo, garantia de uma arquitetura intrigante. Os interiores foram decorados utilizando o melhor do design do norte da Europa e da Itália. Obras de arte de artistas contemporâneos e um pátio com tenda, para ser acessado até no dia mais frio do ano, completam o cenário. Fique de olho na programação dos brunches aos fins de semana e no calendário de noites de jazz, sempre animadas e com público interessante.
Hotel de Rome, a Rocco Forte Hotel
No coração do agitado Mitte, a uma curta distância da praça dos museus e do portão de Brandemburgo, o Hotel de Rome tem decoração art-deco do século 19, resquício da matriz do Dresden Bank que funcionava no prédio, mesclada ao melhor do design contemporâneo em alguns dos quartos mais espaçosos da cidade. Do pátio iluminado onde é servido o café da manhã é possível ouvir os sinos da catedral que soam ao lado. Já o rooftop é um dos endereços mais concorridos na estação mais quente. Aos fins de semana, o bar recebe DJs da cidade para animadas noites de música eletrônica.
Sir Savigny Berlin by Sir Hotels
No “quarteirão da literatura” berlinense, o Sir Savigny é a pedida para quem busca estilo e cultura, com ótimo valor agregado. Os cafés da região emprestam charme a decoração e relembram os tempos em que alguns dos pensadores mais importantes da virada do século 20 frequentavam lugares como o vizinho Romanisches Café. A decoração mescla inspirações do período a mobiliário contemporâneo.
Idiomas oficiais: alemão, inglês amplamente falado na cidade
Moeda: Euro
Clima: Com quatro estações bem definidas, a capital da Alemanha
Museus que recomendamos:
A Museumsinsel, a praça dos museus de Berlim, reúne alguns dos museus mais importantes do mundo. Vale planejar uma passada no Neues Museum para ver de pertinho a Nefertiti e outros artefatos egípcios resquícios em impressionante estado de conservação. O Pergamon Museum, cujo impressionante prédio foi inspirado no Altar de Pérgamo, guarda, além do famoso altar construído para Zeus, as portas do Mercado de Mileto e outros tesouros da antiguidade. Para ver a mais importante coleção de obras do período, remontando a trajetória de gregos, romanos e etruscos, é obrigatória a parada no Altes Museum – o Museu Antigo. Já o Bode Museum é o lar de obras e artefatos que datam do Império Bizantino à Renascença. Pulando para o período moderno, o Alte Nationalgalerie reúne a principal coleção alemã de artistas impressionistas.
Para ver arte de rua, basta andar por Schöneberg ou por Kreuzberg. Recentemente no bairro foi inaugurado o Urban Nation, um museu dedicado ao estilo, com obras de grafiteiros de todos os continentes. E o Schwules Museum, o primeiro museu dedicado à cultura LGBT do mundo, reúne o maior arquivo de obras de artistas e publicações do mundo.