Jochen Zeitz

Ele levou a sustentabilidade para a Puma, fundou o resort Segera no Quênia e criou o museu de arte contemporânea africana da cidade do Cabo

Filho de médicos, nascido em 1963 em Mannheim, Alemanha, o conservacionista e empresário Jochen Zeitz afirma que teve uma infância feliz, ao lado dos pais e dos irmãos.

Os Zeitz sempre amaram a natureza e a vida ao ar livre. “Desde menino costumávamos passar os fins de semana numa cabana na floresta.” Suas primeiras leituras, como a de boa parte das crianças alemãs dos anos 1960, tratavam de aventura, viagens a lugares exóticos e animais selvagens. “Lia tudo sobre a África e o Velho Oeste americano, mas, olhando para eles agora, vejo que estavam cheios de estereótipos e preconceitos.”

Atual CEO, chairman do conselho de administração e presidente da americana Harley-Davidson, depois de se graduar pela European Business School (EBS) e trabalhar na Colgate-Palmolive em Nova York e em Hamburgo, o irrequieto Zeitz começou o que o jornalismo de negócios costuma chamar de “uma carreira meteórica”.

Entrou na Puma em 1990, com 27 anos. Aos 30, já era CEO – foi o mais jovem a conseguir esse posto numa empresa alemã de capital aberto. Quando assumiu, cada ação da Puma valia 8,6 euros. Ao ser comprada pela Kering, conglomerado de marcas de alto luxo, a ação saltara para 350 euros – uma valorização de 4.000% em 13 anos.

O que marca a existência de Jochen Zeitz, no entanto, não é apenas a planilha de Excel. Membro do conselho diretor do Kenya Wildlife Service (KWS), ele se firmou no universo da economia colaborativa por outros motivos. Conseguiu sua posição como um apaixonado inovador tecno-ecológico, um divulgador da arte africana contemporânea e um conservacionista intransigente. Veja como isso aconteceu na entrevista a seguir, concedida por ele com exclusividade à UNQUIET, de sua fazenda no deserto do Novo México, Estados Unidos.

Foto: Tuca Reinés

“O Segera está apoiado em quatro pilares, os 4Cs: conservação, comunidade, cultura e comércio”

Qual viagem marcou a sua vida?
Jochen Zeitz – Minha primeira viagem ao Quênia, em 1989, quando decidi pela primeira vez que queria fazer da África meu lar.

Em 1990 você entrou na Puma. Em três anos, se tornou o CEO da empresa. Você se tornou a pessoa mais jovem da história alemã a conseguir esse cargo em uma empresa de capital aberto. Como foi?
Foi um momento emocionante e desafiador. Comecei com uma reestruturação mundial da Puma (em dificuldades financeiras na época) e implementei um plano de desenvolvimento a longo prazo. As vendas cresceram para quase US$ 4 bilhões de dólares. O preço das ações aumentou cerca de 4.000%, de 8,6 euros no meu primeiro ano como CEO para 350 euros em 2007. De uma marca de preço baixo e produtos com pouco apelo, a Puma virou uma empresa premium. Designers talentosos, homens e mulheres incríveis ligados ao esporte nos ajudaram demais. O resultado foi o surgimento de um mercado de sports lifestyle, que fundiu moda, estilo de vida e esporte.

Que mudanças você promoveu na empresa em termos de sustentabilidade?
Comecei limpando nossas fábricas, agregando a sustentabilidade ao DNA e à missão da marca. Depois desenvolvemos e fomos pioneiros no processo de Environmental Profit & Loss (EP&L). Aí, começamos a informar o público sobre o resultado dos impactos ambientais da Puma.

Essas mudanças inspiraram outras empresas?
Foi – e ainda é – ótimo ver outras marcas sendo influenciadas por essa mudança e seguindo os mesmos passos. É o caso da Kering [corporação que agrega grifes de alto luxo] e a Harley-Davidson. Ambas fazem realmente a diferença, medem o impacto ambiental de seus produtos.

Você fundou, com sir Richard Branson, a Equipe B (B Team) em 2012. Do que se trata e como funciona?
O Plano A – ser business as usual –, impulsionado apenas pelo lucro, não é uma escolha sustentável para as pessoas e para a Terra. Assim, criamos o Plano B. Trata-se de uma solução que vai transformar o futuro dos negócios, se tornar uma força motriz para o benefício social, ambiental e econômico. Inventamos uma plataforma dirigida aos principais líderes empresariais globais. O objetivo: defender e implementar soluções éticas e sustentáveis que sejam viáveis em todos os setores econômicos.

Por que você escolheu Branson como parceiro?
Estive envolvido com a Virgin United por vários anos e ali conheci o Branson. Com o tempo, compartilhamos a ideia de que os negócios precisavam ser parte fundamental de qualquer solução. Finalmente, desenvolvemos o conceito do B Team e lançamos o projeto.

Como foi o desenvolvimento do B Team?
Ele cresceu com grande entusiasmo. No começo, juntou alguns líderes-chave, mas hoje reúne 40 dos empresários mais inspiradores. E continua crescendo…

Oito anos depois, qual o resultado?
Estamos vendo a European Business School (EBS) e a sustentabilidade se tornarem mais importantes nos negócios globais e nas agendas nacionais. Os valores das companhias finalmente se tornaram parte da narrativa para muito mais empresas e líderes. Espero que, por meio de nossa iniciativa, tenhamos contribuído para uma mudança crescente nos negócios.

O que mudou depois de sua primeira ida ao Quênia?
Como eu disse, minha primeira viagem ao Quênia foi em 1989, uma época inspiradora de sentir a natureza em sua forma mais selvagem, de conhecer pessoas incríveis e acolhedoras. Soube na hora que desejava ter uma conexão mais forte com o continente.

Quando você descobriu a região onde se encontra hoje o Segera?
Passei 15 anos procurando o lugar certo. Quando vi o Segera pela primeira vez, soube que havia achado o que eu desejava. Eram 22.500 hectares de fazendas degradadas no norte do Quênia, cheias de gado, mas sem turismo, sem eletricidade, com acesso limitado à água e pouca fauna e flora. “Vou colocar toda a minha energia, a minha paixão, para trazer a vida de volta para cá”, pensei. A ideia era que o Segera fosse uma experiência de safári de luxo, com alta qualidade e impacto ambiental positivo. Um safári ecológico combinado com um retiro cultural. Um centro de arte e conservação da vida animal. Eu desejava compartilhar meu amor pela África com outros – e inspirar as pessoas a fazer mais o bem no mundo.

Fale do desenvolvimento do projeto. 
Foi uma longa jornada. Construir no meio do nada e ainda querer ser sustentável levou muito tempo. Na verdade, comprei a terra e se passou quase uma década antes de eu decidir o que construir, e como. Mas conhecer a área, as comunidades locais, a flora e a fauna foi decisivo para o planejamento. Foi preciso trabalhar as coisas que realmente precisavam mudar e se desenvolver. Eu pretendia causar um impacto positivo a longo prazo.

O que distingue o Segera dos demais resorts africanos de alto padrão? 
O Segera é de alto padrão, mas totalmente sustentável. Trata-se de um destino fundado sobre pilares de longo prazo. Seu éthos está centrado no equilíbrio daquilo que chamo de 4Cs: conservação, comunidade, cultura e comércio. Toda a energia elétrica vem de placas solares. A água da chuva é colhida e reciclada. Embora tenha começado como uma fazenda de pecuária, o Segera é hoje um lugar diversificado, de conservação vibrante. Mais: ele se integrou à vida selvagem e ao futuro dos moradores locais. O Segera se tornou um modelo para o turismo sustentável – e um catalisador para um modo de vida mais atento.

Foto: Divulgação

“Em 2019, o Segera criou um grupo feminino de rangers. As mulheres atuam contra caçadores ilegais”

Todas as suas empresas trabalham com base nos 4Cs. Como eles funcionam?
A fundação Zeitz, o Segera e o projeto The Long Run comprovam: o manejo sustentável de ecossistemas e a criação de uma Terra saudável podem ser alcançados por meio de um equilíbrio holístico dos 4Cs. A conservação salvaguarda a biodiversidade e o uso sustentável dos recursos naturais. Melhorar o bem-estar das comunidades é uma obrigação fundamental, alcançada via condições de trabalho justas, das relações comunitárias, da responsabilidade social, da capacitação e do apoio às pequenas e médias empresas. Em termos da cultura, tentamos fortalecer ativamente as relações e a compreensão intercultural. Isso salvaguarda o patrimônio cultural e aumenta a conscientização da diversidade. Por fim, negócios viáveis fornecem uma fonte de renda à população. E, com investimento no longo prazo, todas essas iniciativas voltam à origem de um dos 4Cs.

No cotidiano, como os 4Cs funcionam?
O Segera protege de modo efetivo a vida selvagem do Quênia. Fortalece as comunidades locais por meio de emprego justo, da educação. Encoraja habilidades tradicionais. Apoia pequenas empresas como a Satubo. Trata-se de uma atividade comercial que sustenta essas e diversas outras iniciativas.

E as escolas infantis?
A fundação Zeitz construiu e mantém seis delas, que educam 1,8 mil crianças das redondezas. incluindo nosso projeto inovador da escola Waterbank. Ela incorpora a colheita de água da chuva e as aulas de horticultura [vencedora do prêmio Greenest School in the World, do LEED Architecture]. Isso permite aos alunos cultivar suas frutas, verduras e legumes – e levar água potável para casa.

Sala de aula de uma das seis escolas mantidas pelo Segera
Foto: Divulgação

Você mencionou acima o Satubo. Do que se trata?
Trata-se do Satubo Women’s Group. A sigla junta as primeiras sílabas de três etnias africanas: samburu, turcana e borana. Elas vivem na área vizinha ao Segera. Nosso trabalho é achar oportunidades alternativas para gerar renda comunitária. Mas foi a necessidade que deu origem ao Satubo. Houve uma seca prolongada e quase todo o gado morreu. A pecuária era a fonte de renda principal das tribos. E as consequências foram devastadoras: as mulheres ficaram sem dinheiro para comprar alimentos, roupas, pagar assistência médica, taxas escolares… A saída foi transformar o artesanato de miçangas e contas, feito por elas havia gerações, num negócio viável. O surgimento do Satubo deu poder às mulheres, que passaram a ajudar no sustento de suas famílias.

O Satubo se baseia nos 4Cs?
Sim. Ele permite a conservação ambiental graças à fonte alternativa de renda. Ela limita a dependência feminina, pois as mulheres não precisam tanto da pecuária nem do pastoreio. As mulheres, capacitadas, preservam parte fundamental de sua cultura – o desenho tradicional de colares, pulseiras e adereços de miçangas. Com o comércio, vem a renda independente, e, com esta, a liberdade financeira. Estamos no momento abrindo um jardim da infância para as moradoras. As mães com filhos em idade pré-escolar poderão continuar a trabalhar, perto
das crianças.

É difícil dar poder às mulheres africanas? Há muitos obstáculos?
O maior desafio é mudar a mentalidade dos homens. Vamos conseguir, com treinamento vocacional e renda para as mulheres. As coisas começam a se transformar.

O Segera treinou um grupo especial de guarda-caças, de rangers, formado só por mulheres.
Em 2019 a fundação Zeitz lançou a primeira academia feminina da África Oriental para a formação de guarda-caças. A ideia é a mesma: criar empregos novos por meio da conservação. Usamos a educação para dar poder às mulheres – numa atividade exercida há gerações apenas por homens. Recrutamos a primeira turma, 12 mulheres, após um demorado processo de seleção em diversas comunidades rurais. Nos seis meses seguintes, elas enfrentaram um programa de treinamento intenso: ioga, meditação, legislação, lutas marciais, tiro, sobrevivência. Fizeram exercícios táticos de campo contra caçadores ilegais. As rangers se formaram em setembro de 2019. Hoje trabalham na proteção do Segera. A segunda turma foi adiada por causa da pandemia. Mas devemos reiniciar o recrutamento. A segunda equipe deverá trabalhar em áreas de conservação por todo o Quênia.

Museu de Arte Contemporânea Africana, na Cidade do Cabo
Foto: Divulgação

“Pretendo plantar
1 milhão de árvores
até 2030 no Segera
e nos arredores.
Começamos esta
tarefa em maio
de 2019″

A fundação Zeitz também apoia o projeto The Long Run. Do que se trata?
O Long Run foi uma iniciativa da fundação, mas hoje cresceu e se tornou uma instituição independente de filantropia, registrada no Reino Unido. É uma iniciativa importante, global, na área do desenvolvimento sustentável, liderada por empresas que trabalham com a natureza. No mundo todo, a Long Run protege mais de 10 milhões de hectares, onde vivem mais de 30 mil espécies, com impacto sobre a vida de 750 mil pessoas.

Há dois resorts no Brasil que já integram o Long Run.
Sim. O refúgio ecológico Caiman, no pantanal de Mato Grosso do Sul, e outro em Santo Antônio, na mata atlântica do Rio de Janeiro. A visão de longo prazo da Long Run se traduz em um mundo onde natureza, empresas e pessoas trabalhem em harmonia para um futuro sustentável. O objetivo? Dar apoio, conectar e inspirar negócios que dependam do meio ambiente.

O que é preciso para fazer parte do Long Run?
Aplicar na prática o conceito dos 4Cs. Em primeiro lugar, se destacar por um alto nível de sustentabilidade. Segundo: demonstrar que o lucro pode e deve andar de mãos dadas com ecossistemas sustentáveis e comunidades prósperas. Uma empresa de turismo que tenha ou administre uma área natural de importância ecológica – e esteja alinhada com a visão e a missão dos 4Cs, vale frisar – pode se candidatar à adesão. Outras organizações, empresas ou profissionais que cultivem valores idênticos podem igualmente aderir como afiliados. Gente capaz de apoiar e inspirar outros membros, por meio da colaboração.

No Segera, você pretende plantar 1 milhão de árvores no formato de um rinoceronte que possa ser visto do ar. Até o momento, são 100 mil árvores plantadas. Como anda esse projeto?
Com a alarmante crise climática mundial e a perda da biodiversidade, o desmatamento se tornou um problema sério no Quênia. A área coberta por florestas e savanas caiu de 10% para 6% apenas na última década. Assim, resolvi lançar essa iniciativa para cultivar uma nova cobertura florestal, no Segera e nos arredores. Queremos plantar 1 milhão de mudas de árvores nativas até 2030. Começamos o plantio em maio de 2020. Outras 150 mil mudas devem ser plantadas quando começar a estação chuvosa, em novembro de 2020. Estamos desenvolvendo ainda uma escola de silvicultura. O objetivo é fornecer educação técnica vocacional aos alunos que vivem na área rural – melhorar a agricultura, tornar a terra mais produtiva. E, claro, ensinarmos conservação e como aproveitar as oportunidades, para a geração de uma renda sustentável.

Por que você gosta tanto da cultura africana?
Ela não é uma cultura, a África é um continente muito diversificado, com inúmeras culturas individuais apenas no Quênia. Há uma enorme quantidade de etnias lá. Assim, não podemos falar em “cultura africana”. Da mesma maneira que não há uma “cultura europeia” ou uma “cultura latino-americana”.

Sua coleção de arte contemporânea africana é conhecida no mundo inteiro. Quando você começou a colecionar?
Em 2008 comecei a colecionar arte contemporânea da África e de sua diáspora, dos artistas exilados. Eu queria montar um acervo que um dia fosse exposto no continente. Uma plataforma para a África compartilhar sua história com o mundo.

Você criou na África do Sul o MOCAA – Zeitz Museum of Contemporary Art Africa. É o mais importante do gênero no mundo. O que você indicaria a quem estiver na cidade do Cabo, com apenas uma hora para visitar o museu?
Olha, há tantas peças interesantes e instigantes, bem como as exposições permanente e temporárias. Digo apenas para tentar ver o máximo possível.

De quem foi a ideia de usar os antigos silos do porto como sede do museu?
Os silos graneleiros do Victoria & Albert Waterfront, na antiga zona portuária reurbanizada, já haviam sido declarados marcos históricos da cidade do Cabo. O governo, entretanto, ainda não havia decidido qual seria sua utilização. Sugeri que abrigassem minha coleção de arte – e nossas visões se alinharam.

Você se preocupa bastante em como os negócios impactam a sociedade – as viagens globais se encaixam nesse conceito?
Viajar não é realmente o problema, mas sim o que vamos fazer a respeito – medir sua pegada e fazer algo para compensá-la. Há diversas maneiras de resolver isso hoje. Não há mais desculpa para não fazer.

Quais são seus valores pessoais?
Tudo que faço é guiado pelos quatro princípios-chave de ser justo, honesto, positivo e criativo [FHPC na sigla em inglês]. Foi uma espécie de bússola moral que desenvolvi enquanto estava na Puma.

Você é o CEO da Harley-Davidson. A marca acaba de lançar sua primeira motocicleta elétrica. Tem seu dedo aí?
Estou na diretoria da Harley-Davidson desde 2007 e presidi seu comitê de sustentabilidade desde sua criação, em 2011. Penso nessa motocicleta elétrica há 13 anos. Mas eu precisava ter certeza de que a moto manteria duas coisas: o torque e a sensação de uma Harley. Posso estar sendo tendencioso, mas eu não poderia estar mais feliz com o resultado.

Que lugares você gostaria de conhecer?
Há muitos lugares que eu gostaria de visitar. Mas passar mais tempo nos lugares que já conheço e amo é minha prioridade. Isso quer dizer no Segera e na fazenda em Santa Fé, no Novo México, Estados Unidos.

As viagens continuarão afetadas pela pandemia? Que tipo de comportamento devemos esperar das pessoas?
Acho que elas estarão muito mais atentas. Vão escolher com cuidado aonde ir. Certamente vão procurar locais seguros e saudáveis. Lugares que se preocupem com seus moradores e com a natureza. A antiga tendência de pular para lá e para cá será reavaliada – as viagens vão se tornar mais conscientes. Ou seja: será imprescindível conhecer bem os lugares que se visita. E não perseguir constantemente a aventura seguinte.

De que modo o Segera se adaptará a esse novo conceito?
O Segera será um lugar a ser visitado depois da pandemia. Ali se vive de maneira consciente, numa área remota, cercada de vida selvagem, com espaço e privacidade de sobra, muito ar puro. E você ainda tem uma comida saudável, orgânica, de origem local.

O que você mais gosta de fazer no Quênia?
Adoro mesmo uma imersão total na natureza. Ver, sentir e experimentar tudo o que me rodeia.

Você fala sete idiomas. Qual a expressão mais bonita em suaíli?
Hakuna shida: sem problemas, sem preocupações.

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