Indicações de leitura por Amyr Klink

Autor de grandes sucessos literários, como Cem Dias entre Céu e Mar, e Paratii, Amyr Klink faz sua curadoria inspirada por livros de grandes exploradores dos mares ‒ e do mundo ‒ em depoimento à UNQUIET

Indicações de leitura por Amyr Klink
Indicações de leitura por Amyr Klink O último lugar da terra
O último lugar da terra, Roland Huntford

O Último Lugar da Terra por Roland Huntford 

“Neste livro, que considero uma obra importantíssima, o Roland Huntford faz uma reconstituição da história da exploração polar desde os primórdios. Ele foi um adido britânico que se apaixonou pela história da corrida aos polos: pela busca pelo Polo Norte e depois pelo Polo Sul, na Antártica, onde os dois principais personagens foram Robert Falcon Scott e Roald Amundsen. O Amundsen, que era norueguês, foi secretamente concorrer com o Scott nessa ‘corrida’ e acabou chegando 35 dias antes ao Polo Sul. O livro percorre a rivalidade entre o norueguês, que, sem recursos, mas apaixonado pela neve, pelo esqui, venceu uma expedição gigantesca, e o britânico. Mas a verdade só é descoberta muito depois. Isso porque, ao chegarem lá, os ingleses encontraram a barraca do Amundsen, provando a vitória norueguesa nessa corrida. Os ingleses morreram no retorno. E ninguém ficou sabendo, até que um ano depois a equipe de base britânica foi à região resgatar os corpos dos ingleses e, juntamente com o corpo de Scott, encontraram um rolo de filme. Essa equipe voltou à Inglaterra e continuou afirmando a supremacia britânica sobre os noruegueses, a quem chamavam de ‘bando de pescadores pobres, amadores, sem raça suficiente para vencer o Império Britânico’. Até que, ao revelar o filme, um ano mais tarde, eles se depararam com a foto dos cinco ingleses da expedição original, incluindo Scott, na frente de uma barraca com a bandeira da Noruega — o que provou a chegada prévia do norueguês ali. É um livro polêmico, mas muito bem escrito e que mostra por que os ingleses fracassaram por arrogância e prepotência, embora ele mesmo, o autor, seja inglês.”

Damien Autour du Monde por Gérard Janichon 

“Outro livro de que eu gosto muito, Damien Autour du Monde foi escrito por Gérard Janichon quando ele e o amigo Jérôme Poncet, aos 22 anos, partiram em um barquinho de madeira de La Rochelle, na França, para uma jornada de cinco anos de volta ao mundo. Nessa embarcação, que nem um barco era exatamente, eles foram do extremo norte do Ártico ao extremo sul da Antártica. Ao longo da viagem, os dois acabaram escrevendo três livros, recentemente reunidos nesta edição. Damien era o nome do barco, que se tornou lendário. O livro, além das aventuras em si, conta a história de dois jovens que partilham uma formidável aventura humana, cheia de descobertas e grandes ideais. Eles influenciaram toda uma geração de jovens nos anos 1960 e 70: criaram uma espécie de diáspora na França, já que, depois dos livros deles, houve uma geração inteira que começou a construir barquinhos no quintal de casa para sair pelo mundo. E de fato saiu. Infelizmente eu não conheci o Janichon, que era um grande intelectual. Mas sou muito amigo do Jérôme e da mulher dele, a Sally, que também escreveu um livro que me marcou profundamente.”

Indicações de leitura por Amyr Klink Damien Autour du Monde
Damien Autour du Monde, Gérard Janichon
Indicações de leitura por Amyr Klink  La longue route Bernard Moitessier
La longue route, Bernard Moitessier

La Longue Route por Bernard Moitessier  

“Este livro influenciou fortemente a cultura francesa. Trata-se de um navegador meio aventureiro, que fazia contrabando, chamado Bernard Moitessier. Ele participou da primeira regata em que um jornal em inglês ofereceu um prêmio ao velejador que conseguisse contornar a terra sozinho, sem fazer escalas, saindo de pontos diferentes da Europa. Na verdade, só um velejador chegou, e não foi o Bernard: ele era pobre, precário, só que amava estar no mar. Quando ele atravessou o Oceano Índico, o Pacífico e finalmente entrou no Atlântico de novo – sem rádio, sem equipamento nenhum ‒, pensou: ‘Os ingleses todos já devem estar tomando cerveja, celebrando a vitória, e meu barco tão lento aqui’. Nesse momento, ele continuou navegando e fez mais três quartos de uma volta ao mundo, até que acabou parando num atol no Pacífico, onde viveu até morrer. Foi lá que Moitessier escreveu uma série de livros interessantes, e o primeiro deles foi justamente La Longue Route, que narra esse episódio. Foi um livro que eu adorei ler porque é muito bem escrito e tem um conteúdo filosófico muito forte.”

Indicações de leitura por Amyr Klink A lua vem da Ásia Campos de Carvalho
A lua vem da Ásia, Campos de Carvalho

A Lua Vem da Ásia por Campos de Carvalho 

“Com um texto extremamente ácido e inteligentemente cômico, Campos de Carvalho escreveu diversos livros muito interessantes. Na minha opinião, a Lua Vem da Ásia é sua obra-prima em língua portuguesa, um livro sobre um viajante imaginário, um texto absolutamente espetacular — que foi prefaciado pelo Antônio Prata na última edição, pela José Olympio Editora. É uma obra sobre viagens do absurdo. Ele narra passagens absolutamente surrealistas, mas com um humor refinado, sempre por meio de viagens inventadas com um viés muito instigante. Para quem gosta do universo, da temática de viagens, este é um livro que vale a pena ler, mesmo que sejam viagens saídas de dentro da cabeça do autor.”

Ensaio sobre as Construções navais Indígenas do Brasil por Antônio Alves Câmara   

“O autor foi um almirante brasileiro, Antônio Alves Câmara, que viajou o Brasil inteiro como oficial de marinha. Pelos idos de 1885, ele ficou chocado quando leu num noticiário inglês uma crítica falando sobre a precariedade das embarcações brasileiras. Ele já tinha viajado pelo mundo e conhecia o Brasil como ninguém. Foi quando resolveu contestar os ingleses e mostrar que o Brasil era o país que tinha a maior diversidade de barcos regionais do planeta. Foi assim que ele escreveu um livro que dá orgulho a nós, brasileiros, quando se lê. Esta obra era para ser o início de uma série de livros sobre a riqueza naval autóctone brasileira, e, na verdade virou a bíblia sobre o tema. Ao lê-lo, percebe-se um patrimônio cultural absolutamente único e do qual quase não se fala. E o Alves Câmara dá uma descrição muito bonita, e até mesmo poética em alguns momentos, sobre uma arte que quase desapareceu.”

Indicações de leitura por Amyr Klink Ensaio sobre as construções navais indígenas do Brasil
Ensaio sobre as construções navais indígenas do Brasil, Antônio Alves Câmara

+ Confira outras indicações de livros e livrarias

Matéria publicada na edição 15 da revista UNQUIET

    UNQUIET Newsletter

    Voltar ao topo